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Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, faz intervenção inicial e responde a perguntas de jornalistas em conferência de imprensa conjunta com o Ministro dos Negócios Estrangeiros do Líbano, Abdallah Bou Habib, após as conversações Moscovo, 22 de novembro de 2021

Senhoras e Senhores,

Gostaria de felicitar o Senhor Ministro, a sua comitiva e todos os libaneses pela Data Nacional, o Dia da Independência, e desejar paz, bem-estar e prosperidade ao povo amigável e sofredor do Líbano.

É-nos especialmente importante ver que, neste dia, o meu colega Abdallah Bou Habib está em visita de trabalho a Moscovo. Penso que este facto põe em relevo a importância especial que atribuímos ao desenvolvimento das nossas relações bilaterais.

Abordámos detalhadamente um vasto leque de questões. Sublinhámos o interesse que se mantém e até vem crescendo em ampliar o nosso diálogo político, aprofundar a nossa cooperação prática nas áreas de comércio, economia e de investimento e em ampliar as nossas relações humanitárias, culturais e aquelas no setor de ensino, assim como a interação entre as comunidades religiosas da Rússia e do Líbano que tem uma longa história. A Igreja Ortodoxa Russa tem cooperado tradicionalmente de perto com os seus colegas libaneses. Em todas estas áreas estamos a criar e a usar de forma ativa um quadro jurídico, estamos a concretizar vários projetos mutuamente vantajosos. Examinámos as perspetivas da possível participação de agentes económicos russos na restauração das infraestruturas destruídas pelas explosões ocorridas a 4 de agosto de 2020 no porto de Beirute. A pedido do Governo libanês, passámos hoje ao lado libanês imagens via satélite feitas pela Agência Espacial da Rússia (Roscosmos). Esperamos que ajudem a investigar as causas do incidente. Esta questão prende atualmente grande atenção no Líbano. Esperamos que possa ser solucionada e que a verdade venha a ser esclarecida.

Discutimos os esforços conjuntos, incluindo as atividades das nossas empresas (Novatek e Rosneft) para desenvolver o setor energético libanês, incluindo as questões relacionadas com a perfuração na plataforma continental libanesa, operação que envolve a empresa Novatek, e o desenvolvimento de um terminal de armazenamento de produtos petrolíferos pertencente à Rosneft e situado no porto do Líbano.

Agradecemos aos nossos colegas a informação franca e útil sobre a situação política interna no Líbano. Dadas as peculiaridades da sociedade libanesa multirreligiosa, temos sempre encarado a necessidade da manutenção da estabilidade nesse país como pré-requisito importante para a segurança regional no Médio Oriente.

Reafirmámos a nossa total fidelidade à soberania, independência e integridade territorial do Líbano. Entendemos que os libaneses devem resolver sozinhos todas as questões relacionadas com o funcionamento do seu Estado, a vida do seu país e quaisquer questões da agenda nacional através de um diálogo numa base constitucional, demonstrando respeito uns pelos outros e disponibilidade para um compromisso. Sentimos que o Senhor Ministro, que representa o governo formado recentemente por Najib Mikati, é precisamente desta opinião. O novo Governo é de coligação. A sua criação em setembro deste ano pôs fim a um longo período de crise libanesa interna. Temos esperança e razões para acreditar que o Primeiro-Ministro e a sua equipa conseguirão estabilizar a situação no país, tirá-lo da prolongada crise social e económica e organizar o funcionamento de todas as instituições de Estado.

Discutimos a agenda internacional e regional. As nossas posições são próximas ou totalmente coincidentes. A situação no Médio Oriente é difícil e até explosiva nalgumas regiões. Estamos convencidos de que o Líbano não deve ser visto por ninguém como objeto de interferência externa. Tais tentativas estão a ser feitas, a partir de muitos locais diferentes. Estamos convencidos de que isto é prejudicial tanto para o Líbano como para a situação regional. O Líbano não deve ser "palco de ajuste de contas" entre países terceiros. Tais tendências também estão presentes. Somos certamente contra o país ser refém da crise na vizinha Síria. Constatámos haver algumas tendências positivas, incluindo o acordo alcançado sobre o transporte para o Líbano da eletricidade proveniente da Jordânia e do gás proveniente do Egito através do território sírio. Este é um passo importante que indica a direção em que devemos trabalhar a fim de criar uma base material e económica sustentável para a resolução dos problemas políticos na região.

Falámos sobre as vias de reforço da cooperação russo-libanesa nas questões relacionadas com o repatriamento seguro dos sírios que se refugiaram temporariamente no Líbano. Fomos unânimes em afirmar que a comunidade internacional, prestando atenção a este problema e disponibilizando avultados recursos financeiros para resolver os problemas dos refugiados da Síria, deve concentrar os seus esforços e contribuições na criação de condições dentro da República Árabe Síria para permitir o regresso dos refugiados dos campos no Líbano, Jordânia, Turquia e Egito. Infelizmente, os nossos parceiros ocidentais investem a maior parte dos recursos desembolsados em manter os refugiados nesses campos fora da Síria. Isto não ajuda a implementação da Resolução 2254, que exige especificamente que os refugiados sírios regressem aos seus lares.

O Senhor Ministro fez-me um amável convite para uma visita ao Líbano. Eu agradeci-lhe e aceitei de bom grado o seu convite.

Pergunta: Em que medida as imagens que o senhor entregou hoje ao seu colega libanês podem ajudar na investigação da explosão de Beirute? As acusações que estão a ser feitas são muito diferentes e, portanto, as raízes da atual crise política estão precisamente nessa explosão? 

Serguei Lavrov: Quanto às perguntas sobre imagens via satélite, não sei o quanto podem ajudar na investigação. Não sou especialista. Cumprimos a diretiva do Presidente da Rússia, Vladimir Putin, que nos deu a respetiva ordem após conversar com o Presidente Michel Aoun. A Roscosmos concedeu-nos fotografias que mostram a situação no porto visto do espaço na primavera de 2020, ou seja, antes da explosão, e a situação no porto após as explosões. Os funcionários da Roscosmos disseram-nos que os especialistas deveriam compreender pela natureza dos danos causados o que isso poderia ter sido. Esperemos que os especialistas no Líbano, com a ajuda dos seus colegas estrangeiros, resolvam a questão, que está realmente a tornar-se um forte fator irritante político para o Líbano. Queremos que esta questão seja solucionada, o mais rapidamente possível.

Pergunta: A Rússia participou ou ajudou a resolver a questão da demarcação da fronteira marítima entre o Líbano e Israel? Uma vez que a Rússia está envolvida na exploração do campo petrolífero offshore libanês, quais acordos referentes ao assunto existem hoje? Para quando podemos esperar o início de trabalhos no âmbito destes projetos?

Existe algum mecanismo concreto, algum acordo bilateral para tirar esta questão do ponto morto? Quando os refugiados sírios começarão a regressar às suas casas?

Serguei Lavrov: Abordámos brevemente a situação nas negociações sobre a demarcação das fronteiras marítimas entre o Líbano e Israel. O Senhor Ministro explicou-nos que as negociações prosseguiam. Talvez ele esteja pronto para dar maiores informações.

No que diz respeito à extração de petróleo e gás. Temos, como eu já disse, empresas russas, particularmente a Novatek, a praticarem prospeção e extração de hidrocarbonetos e a planearem perfurar outro poço offshore no início de 2022. A empresa Rosneft fez um contrato para a gestão operacional de um terminal de armazenamento de produtos petrolíferos no porto de Trípoli. Existem planos concretos para atualizar e ampliar este terminal.

Hoje discutimos com os nossos colegas medidas que devem ser tomadas para preparar condições para o início dos trabalhos, o mais rapidamente possível. O Ministério da Energia do Líbano enviar-nos-á propostas às quais responderemos.

Quanto aos refugiados, já comentei tudo. Infelizmente, quando a primeira conferência sobre o regresso dos refugiados foi convocada em Damasco há exatamente um ano, os EUA e a UE fizeram esforços desesperados e indecentes para impedir a realização do evento. Fizeram duras démarches em relação às capitais dos países convidados para persuadi-los a não aceitarem o convite e a não enviarem as suas delegações a Damasco para participar na conferência para o regresso dos refugiados. Até o Secretário-Geral da ONU foi chantageado e recusou-se a enviar uma delegação. Pediu ao seu representante, que trabalhava em Damasco, para participar como observador. É grande pena, ações como estas prejudicam muito o direito humanitário internacional, que exige que todas as questões relacionadas com os refugiados, com o seu regresso, sejam tratadas exclusivamente em coordenação com o país de acolhimento cujos nacionais estão no estrangeiro. Isto foi, no mínimo, inaceitável e arrogante, porque, passados uns dois meses, a UE convocou em Bruxelas a sua conferência sobre refugiados sírios que foi copresidida pelo Secretário-Geral da ONU, para a minha grande pena, o que não fez honra a este cargo. Os participantes naquela conferência dedicaram-se a juntar fundos para enviá-los aos campos de refugiados no Líbano, na Jordânia, na Turquia e no Egito. É de salientar que nenhum representante do governo sírio foi convidado para esta conferência, é uma violação flagrante do direito humanitário internacional. Estamos agora a pensar em apoiar a República Árabe Síria, o Líbano e outros países que deram abrigo a refugiados sírios e em realizar uma segunda conferência sobre este assunto num dos países onde se encontra atualmente a maioria dos refugiados sírios.

Se os nossos amigos libaneses estiverem interessados, iremos apoiá-los. Estamos convencidos de que o fardo carregado pelo Líbano (que acolhe mais de meio milhão de refugiados palestinianos e um número ainda maior de refugiados sírios) é muito grande para um país tão pequeno, algo tem de ser feito. Espero que os doadores ocidentais também estejam conscientes da sua responsabilidade.

Também abordámos detalhadamente a situação no processo de paz palestino-israelita. Estamos muito preocupados ao ver que as coisas "permanecem paradas" e as conversações diretas entre os líderes da Palestina e de Israel não são retomadas. O "quarteto" de mediadores internacionais está a trabalhar. Todavia, todos os seus contactos limitam-se a uma mera constatação daquilo que está a acontecer, não há novas ideias. Neste contexto, continuamos interessados em apoiar a iniciativa do Presidente Mahmoud Abbas de convocar uma conferência internacional sobre a questão palestiniana.

Sugerimos, em tempos, realizar, como fase preparatória, um encontro dos Ministros dos Negócios Estrangeiros dos países do "quarteto" com a participação de líderes árabes e das partes em conflito. Veremos como os acontecimentos se desenrolarão. Muito se tornará claro durante a visita do Presidente da Palestina à Federação da Rússia prevista para amanhã. Será importante ouvir dele como vão as coisas no processo de restauração da unidade palestiniana, entre a Fatah e o Hamas.               

Pergunta: Os esforços diplomáticos e políticos conjuntos russo-libaneses ajudaram a ultrapassar fatores internos e externos que dificultam um apoio substancial por parte da Federação da Rússia? Houve muitas iniciativas referentes à participação da Rússia na reconstrução das infraestruturas libanesas e à exploração dos campos de petróleo e de gás pelas empresas russas Novatek e Rosneft. Em que medida é que os vossos esforços conjuntos foram capazes de superar as desavenças internas e externas libanesas?

Serguei Lavrov: Já falei sobre os planos que temos em relação às empresas Novatek e Rosneft. Não nos compete a nós julgar em que medida a contribuição destas e de outras empresas russas dispostas a participar na reconstrução das infraestruturas do Líbano irá contribuir para o desenvolvimento do país. É ao Líbano, ao seu povo e à sua liderança que compete julgar.

Pergunta (endereçada a Abdallah Bou Habib): O senhor escolheu a Federação da Rússia para a sua primeira deslocação internacional. O senhor é um excelente diplomata com um enorme historial de trabalho em diversos países. A sua visita é a sua aspiração e orientação da política externa libanesa para o Leste (o seu primeiro "destino" é a Federação da Rússia?)

Serguei Lavrov (acrescentando após Abdallah Bou Habib): A Rússia respeita esta posição do Líbano. Ao contrário dos países ocidentais, nunca dizemos a nenhum dos nossos parceiros com qual dos países ele deve fazer amizade e com qual não deve ter relações. Os nossos colegas americanos e alguns colegas europeus não se cansam a exigir que outros países deixem de cooperar com a Rússia e a China nas áreas de comércio, economia, investimento e da cooperação técnico-militar. Não escondem estes factos. A Rússia nunca colocou condições semelhantes a ninguém. Respeitamos sempre a soberania e o direito soberano dos nossos parceiros de escolherem com quem desejam cooperar no cenário internacional.

Pergunta: Os meios de comunicação social afirmam que a Ucrânia utilizou pela primeira vez os sistemas de mísseis norte-americanos Javelin em Donbass. Moscovo tem alguns dados sobre isto? Moscovo não receia que isto possa vir a desestabilizar completamente a situação em Donbass? A Rússia tem a intenção de manter algum contacto com os Estados Unidos sobre a Ucrânia num futuro próximo?

Serguei Lavrov:  Ainda não ouvi esta notícia. Todavia, nas últimas semanas, nos últimos meses temos visto um "fluxo de consciência" na liderança ucraniana, especialmente nos militares, um fluxo de uma consciência inflamada e muito perigosa. Quando uma retórica beligerante se torna cada vez mais intensa, ela reflete o desejo de levar a cabo uma provocação e fazer transitar o conflito para uma fase armada. Em declarações públicas, o comandante-chefe das forças armadas ucranianas e o comandante da "operação de forças unidas" em Donbass anunciam sempre os seus planos agressivos. Antes havia o termo "clique militarista". Não encontro outra expressão senão: planos agressivos da "clique militarista ucraniana".  Ameaçam usar os Javelins e já usaram um Bayraktar. Não é que tenham dito que o tinham feito por acidente, porque é categoricamente proibido pelos acordos de Minsk, mas relataram-no com orgulho, confundindo-se, contudo, nos seus depoimentos. Primeiro disseram que o haviam feito, depois disseram que não o haviam feito, depois confessaram terem feito isso. Não só confessaram, como também disseram que continuariam a utilizar veículos aéreos não tripulados para ataques a Donbass, ignorando assim mais uma vez os seus compromissos ao abrigo dos acordos de Minsk.

Outro exemplo da sua retórica belicosa é a sua afirmação de que os militares ucranianos em Donbass não têm restrições no uso de armas. Podem abrir fogo quando quiserem. Isto visa diretamente a recusa da Ucrânia em implementar os acordos que assinou em julho de 2020 e que estabeleciam como as partes deveriam reagir aos tiros e como deveriam acordar o fogo de retaliação. Esta é precisamente a questão a que os nossos colegas da Alemanha e França quiseram dedicar uma reunião no formato Normandia, entre outros temas. Tanto Donetsk como Lugansk estão a cumprir os seus compromissos. A Ucrânia retirou-se publicamente desses acordos. Em vez de dar à Ucrânia uma "palmada no pulso" e forçar os seus "clientes" em Kiev a cumprir o que foi acordado com a assistência e apoio do Reino Unido e da França, estamos a ser instados a uma nova reunião no formato Normandia. É um caminho para lado nenhum. Estou muito preocupado com a teimosia com que Berlim e Paris não querem apoiar os acordos de Minsk e querem justificar de todas as formas possíveis as ações inaceitáveis do regime de Kiev.

Quanto aos EUA, durante a cimeira de Genebra do Presidente da Rússia, Vladimir Putin, e do Presidente dos EUA, Joe Biden, o Presidente norte-americano reafirmou o seu compromisso com os acordos de Minsk.

Admitiu que a parte dos acordos referente a um estatuto especial para Donbass deveria ser observada. Este assunto foi abordado durante a visita à Rússia da Subsecretária de Estado dos EUA, Victoria Nuland. Ela confirmou esta posição do Presidente Joe Biden durante as suas reuniões no Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia e no Gabinete do Presidente da Federação da Rússia. Consideramos que os EUA têm uma compreensão ligeiramente melhor da situação atual. Ninguém duvida que eles podem influenciar Kiev mais do que qualquer outro país. Veremos até que ponto os EUA podem traduzir as suas palavras em atos que ajudem a implementar os acordos de Minsk.

Não consideramos necessário criar quaisquer novos formatos. Existe o formato Normandia, existe o mecanismo mais importante destinado a ajudar na implementação dos acordos contidos no Pacote de Medidas de Minsk e nas decisões subsequentes. Refiro-me ao Grupo de Contacto para a resolução pacífica da situação no leste da Ucrânia, onde os representantes de Donetsk, Lugansk e Kiev se encontram em contacto direto com a ajuda da OSCE e da Federação da Rússia. É neste formato que todos os acordos alcançados em Minsk devem ser implementados. Durante o próximo contacto entre os nossos Presidentes (as suas datas e os seus outros parâmetros estão a ser acordados), a questão ucraniana surgirá sem dúvida de uma forma ou de outra. A Rússia não vê necessidade de criar novos formatos. Sob a administração norte-americana anterior, tivemos contactos com representantes dos EUA sem prejudicar o prestígio do "quarteto Normandia" e sem atacar as prerrogativas do Grupo de Contacto. Tais contactos são bastante úteis para as trocas de pontos de vista e discussões sobre como a enorme influência dos EUA sobre o regime de Kiev poderia ser utilizada para alcançar resultados positivos.

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