Resumo do briefing realizado pelo Vice-Diretor do Departamento de Informação e Imprensa do MNE da Rússia, Ivan Nechayev, Moscovo, 11 de agosto de 2022
Ponto da situação no Donbass e na Ucrânia
A operação militar especial na Ucrânia continua. As forças aliadas da Rússia, da República Popular de Donetsk (RPD) e da República Popular de Lugansk (RPL) seguem cumprindo os objetivos relacionados com a defesa da população civil do Donbass, a desmilitarização e a desnazificação da Ucrânia e a remoção das ameaças à segurança da Rússia. A fim de evitar vítimas entre os civis, as forças aliadas atacam apenas alvos militares, utilizando armas de alta precisão.
Nos territórios libertados da RPD, RPL e das Regiões de Zaporozhye, Kharkov e Kherson a situação está a voltar à normalidade, tendo mais de 400 hectares sido limpos de minas e outros engenhos explosivos e mais de 50 mil engenhos explosivos sido descobertos. Avança a bom ritmo o processo de reconstrução de habitações e infraestruturas sociais, tendo os escombros sido removidos numa área de 200 mil metros quadrados. Os habitantes dos referidos territórios recebem ajuda humanitária russa. Desde março passado, a Rússia enviou mais de 56.000 toneladas de ajuda. Segundo os dados disponíveis até aos finais de julho passado, mais de 300 mil reformados da RPD e da RPL e dos territórios libertados receberam prestações sociais.
Enquanto isso, as tropas ucranianas e unidades neonazis compostas, entre outros, por mercenários estrangeiros, continuam a utilizar métodos de combate inaceitáveis, criando posições de fogo em prédios residenciais, lançando minas borboletas em cidades e aldeias do Donbass, colocando canhões e lançadores múltiplos de foguetes perto de escolas e hospitais, instalando quartéis e depósitos de munições em edifícios escolares e outros locais civis, bombardeando infraestruturas energéticas críticas.
Nos últimos dias, as tropas ucranianas bombardearam várias vezes o território da Central Nuclear de Zaporozhye, o que representa um ato de terrorismo nuclear. Estas ações do regime de Kiev podem provocar uma catástrofe muito pior do que a que teve lugar na Central de Chernobyl, com a exposição à radiação a atingir não só as regiões vizinhas na Ucrânia, Rússia, RPD e RPL, como também os países europeus. Como resultado, milhões de vidas serão postas em risco. Hoje, dia 11 de agosto, o Conselho de Segurança da ONU realiza, por iniciativa da Rússia, uma reunião sobre este assunto. Esperamos que a comunidade internacional e os organismos internacionais especializados prestem a devida atenção à situação desastrosa criada. Defendemos que a AIEA envie uma missão à Central Nuclear de Zaporozhye. Esta iniciativa foi abortada em junho passado por decisão do Departamento de Segurança e Proteção do Secretariado da ONU.
Neste contexto, os países da NATO empenhados em promover os seus interesses no espaço pós-soviético continuam a apoiar o regime de Kiev e a contribuir para a sua militarização. No passado dia 8 de agosto, os EUA anunciaram mais um pacote de ajuda militar à Ucrânia no valor de mil milhões de dólares, atingindo assim o montante global gasto pelos EUA em ajuda militar à Ucrânia 9,8 mil milhões de dólares desde o início da presidência de Joe Biden e 11,8 mil milhões de dólares desde 2014. Esta política só protela as ações militares sem fazer nada para chegar a um acordo.
Os fornecimentos maciços de armas ao regime de Kiev fizeram com que o tráfico de armas aumentasse, inclusive nos mercados da darknet. De acordo com as informações de que dispomos, a polícia dos países da UE confisca e devolve à Ucrânia centenas de espingardas de assalto e dezenas de milhares de munições para as mesmas traficadas daquele país. Todavia, as armas ligeiras não são as únicas a serem traficadas. Por exemplo, alguns sites da “deep web” oferecem foguetes para o Javelin por 30 mil dólares. Isso quando o seu fabrico custa seis vezes mais, 178.000 dólares. Também estão à venda foguetes para o NLAW, por 15 mil dólares, drones kamikaze Switchblade 600, por sete mil dólares, armas ligeiras, granadas e coletes à prova de bala com preços que variam entre mil e três mil dólares e meio.
Esta tendência alarmante causa cada vez mais perguntas à opinião pública ocidental. A cadeia de televisão norte-americana CBS até lançou um documentário sobre as armas ocidentais entregues à Ucrânia, divulgando factos desagradáveis aos governos ucraniano e ocidentais. Não é de surpreender que o filme tenha acabado removido da internet a pretexto de precisar de atualizações. No entanto, as suas cópias estão ainda disponíveis para visualização.
Os EUA não se limitam a fornecer armas à Ucrânia, compartilhando com ela dados de inteligência, para o que utilizam satélites civis e privados para além dos militares, o que de facto equivale à militarização do espaço circunterrestre.
A Rússia continua a trabalhar no Centro de Coordenação Conjunta (CCJ), em Istambul, para embarques de cereais da Ucrânia. Desde o dia 1 de agosto, 12 navios com 375 mil toneladas de produtos agrícolas a bordo deixaram os portos ucranianos. É de salientar que, muito antes de se ter chegado a acordo sobre os cerais ucranianos, o Ministério da Defesa da Rússia mantinha os corredores humanitários marítimos abertos, estendendo-os agora para 307 milhas náuticas, funcionando estes últimos durante 24 horas por dia.
Tomámos nota da situação com o graneleiro Razoni, que partiu de Odessa a 1 de agosto com destino a Trípoli, no Líbano. Verificou-se que transportava milho forrageiro e não o trigo de que os libaneses precisavam. O destinatário da carga em Trípoli recusou-se a receber o milho e o navio está agora à espera de novos clientes.
Infelizmente, até agora, nenhum navio com cereais chegou aos países em crise de fome da África e do Sul da Ásia. Seguem principalmente para portos ocidentais, transportando milho e óleo de girassol, e não trigo, o que nos faz duvidar da sinceridade das declarações do Ocidente de que o “acordo de cereais” tem importância vital para a segurança alimentar global.
A Australian National Review divulgou outro facto revelador. De acordo com o periódico, três gigantes alimentares e químicos norte-americanos, a Cargill, a Dupont e a Monsanto, possuem 17 milhões dos 64 milhões de hectares de terras agrícolas na Ucrânia, cultivando trigo na Ucrânia e são os que o vendem.
Gostaria de lembrar que o pacote de documentos assinados em Istambul incluía não só um acordo de exportação de cereais de três portos ucranianos que começou há uma semana e meia, como também um documento sobre a promoção de gêneros alimentícios e fertilizantes russos nos mercados internacionais. Até à data, esta última disposição continua por concretizar. Esperamos que todos os acordos incluídos neste pacote venham a concretizar-se na íntegra e que os países ocidentais venham a criar condições para que os fertilizantes e alimentos russos tenham acesso ao mercado global.
Ao mesmo tempo, tudo isto prova mais uma vez que os países ocidentais estão a utilizar a crise na Ucrânia no seu próprio interesse. Apesar de todo o apoio que estão a prestar ao regime de Kiev e de todos os esforços para preservar um foco de instabilidade no Leste da Europa, os objetivos da operação militar especial serão atingidos.
Ponto da situação na Moldávia
Continuamos a acompanhar de perto a evolução da situação na República da Moldávia. É um país com o qual temos laços estreitos e onde vive um grande número dos nossos compatriotas. A degradação da situação em termos de liberdade de imprensa é para nós um motivo de grande preocupação. As autoridades moldavas estão a exercer pressão sobre os mass media independentes e da oposição, limpando o espaço mediático de opiniões e avaliações inconvenientes ao governo.
Como é sabido, desde março passado, estão proibidos no país noticiários e programas televisivos sociopolíticos russos a pretexto de “combate à desinformação". As autoridades locais estão a acompanhar de perto os programas transmitidos pelos canais de língua russa, multando-os com especial empenho. No passado dia 5 de agosto, o Conselho de Radiodifusão da Moldávia multou mais uma vez quatro cadeias de televisão de língua russa: a NTV Moldova, a Exclusive TV, a Primeiro na Moldova e a Accent TV, por "desvios" em relação às regras estabelecidas.
No dia 1 de agosto, o Serviço de Informação e Segurança da Moldávia bloqueou o acesso ao website russo “Imprensa Livre” por alegada "cobertura tendenciosa" da operação militar especial na Ucrânia e publicação de "informação enganosa" que poderia prejudicar a segurança nacional do país.
Neste contexto surge a pergunta: Em que medida é que a política seguida pelas autoridades de Chisinau para os mass media corresponde ao seu compromisso declarado com os "valores democráticos", entre os quais a liberdade de expressão e de opinião e a liberdade dos meios de comunicação social?
Tomámos igualmente nota da notícia divulgada a 8 de agosto pelo serviço de imprensa do Tribunal Constitucional da Moldávia relativamente à sua carta à Comissão de Veneza do Conselho da Europa em que pediu um parecer sobre a proibição legal da “Fita de São Jorge” posta em vigor no país em abril passado. Trata-se das emendas à Lei do Combate às Atividades Extremistas e ao Código de Infrações Administrativas que estipulam sanções pela utilização de atributos e símbolos da chamada agressão militar, assim como de "bandeiras e fitas coloridas, símbolos, distintivos e outros sinais semelhantes", que incluíam a Fita de São Jorge. Como sabemos, a proibição foi imposta especificamente antes das celebrações do Dia da Vitória e provocou uma forte reação negativa por parte de uma parte significativa da sociedade moldava.
Infelizmente, nas atuais circunstâncias, não podemos esperar que a Comissão de Veneza, que demonstrou repetidamente uma atitude tendenciosa e politizada, examine o pedido do Tribunal Constitucional moldavo de forma responsável e imparcial.
Instamos as autoridades moldavas a reconsiderarem a sua política de restrição dos direitos e liberdades mais elementares dos seus cidadãos e a tomarem as medidas necessárias para garantir a sua observância.
Sobre declarações anti-russas da Ministra francesa, Catherine Colonna, sobre o papel e a política da Rússia no continente africano
Lemos a entrevista concedida pela Ministra da Europa e das Relações Exteriores da França, Catherine Colonna, ao jornal Liberation e publicada na sua edição de 4 de agosto. Contém todo o conjunto de chavões antirussos reproduzidos nos últimos meses em grande escala pelos mass media franceses. Neste sentido, não oferece nada de novo nem teria merecido a nossa atenção se não fosse um facto.
A Ministra francesa tomou a liberdade de fazer uma série de declarações mordazes sobre o aumento da presença russa no continente africano, descrevendo-o como “tentativas da Rússia de usar os meios mais atrozes para restaurar o seu poder imperial" e como a “agressividade” de Moscovo nalguns países africanos. Estas declarações, além de serem absurdas em si, especialmente considerando-se a hospitalidade e cordialidade com que o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, foi recebido durante a sua recente visita a quatro nações africanas, hipócritas e provocadoras, foram feitas pela chefe da diplomacia da França, país cuja política para as suas antigas possessões africanas foi e continua a ser exemplo do conceito de neocolonialismo.
Foi Paris, e não Moscovo, que levou a cabo numerosas operações militares em África, promovendo os seus interesses egoístas. É a França que mantém uma rede de bases militares no continente africano e tem o maior número de efetivos ali acantonados. Foram os franceses que impuseram a muitos países africanos acordos desiguais de defesa e/ou de cooperação técnico-militar que, ainda hoje, servem de moldura legal para a presença militar e até intervenções francesas no continente. Finalmente, é a França, “tão preocupada em defender os interesses africanos”, que, ao contrário da vontade da maioria dos países, continua a controlar alguns dos territórios que herdou do seu antigo império colonial e que pertencem ao continente africano. Usando vários pretextos, Paris mantém sob o seu controlo as ilhas de Mayotte, Eparses e Europa, Tromelin. E o que dizer da recusa arrogante da França em reconhecer a sua responsabilidade pelos numerosos crimes de guerra cometidos durante a guerra de independência da Argélia e as consequências dos seus testes nucleares ali realizados? E o que dizer das suas tentativas de escapar à responsabilidade pela destruição do Estado líbio em 2011, o que gerou muitos dos problemas na região do Saara-Sahel?
Poderíamos continuar a lista, porque Paris tem muitas conquistas no seu curriculum africano. No entanto, creio que é desnecessário, porque a maioria dos africanos compreendeu há muito o que a "França maravilhosa" quer do seu continente e faz as respetivas conclusões. Daí as declarações irritadas de altas personalidades francesas sobre a perda das posições da França nos países africanos vistos por elas ainda hoje, por hábito herdado da época colonial, como integrados na esfera dos seus interesses tradicionais. O facto de, em alguns casos, aqueles que o Palácio Elysee e o Quai d'Orsay têm tratado como seus “clientes” optarem agora por estreitar as suas relações com a Rússia, é apenas uma consequência lógica das diferenças objetivas entre as posições de Moscovo e de Paris sobre o relacionamento com África. Quer os franceses gostem quer não, é aos africanos que cabe decidir.
Quanto à Rússia, oferecemos aos africanos uma parceria igual e mutuamente respeitosa, sem lhes impor condições políticas nem a nossa visão do que é bom e do que é mau, do que é certo e do que é errado. Se esta nossa posição encontra eco positivo nos africanos, não será tempo de os nossos oponentes geopolíticos, entre os quais a França, ponderarem se estão do “lado certo da história” e de reconsiderarem a sua política, em vez de cuspir veneno contra a Rússia?
Resumo da sessão de perguntas e respostas:
Pergunta: O Presidente da Ucrânia, Vladimir Zelensky, e a Primeira-Ministra da Estónia, Kaja Kallas, pediram, quase simultaneamente, que a Europa deixasse de emitir vistos aos russos para viajar para países ocidentais. Como é que o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo avalia os seus pedidos? Qual poderá ser a resposta da Rússia se os países ocidentais derem este passo?
Ivan Nechayev: Já comentámos estas declarações provocatórias. Consideramo-las como manifestação aberta de chauvinismo, desejo irrefletido de "cancelar" tudo o que é russo. É impossível.
A propósito, a Letónia deixou recentemente de emitir quase todos os tipos de vistos a cidadãos russos. Estes passos para impedir os russos de visitar a UE, mostram que o desejo do regime ucraniano e dos os seus apoiantes russofóbicos da UE, provocado pela raiva impotente, de punir coletivamente todos os russos simplesmente por serem cidadãos de um país que segue uma política externa independente e defende firmemente os seus interesses nacionais. Os autores destas iniciativas parecem não estar preocupados com o facto de o Código de Vistos de Schengen não estipula a possibilidade de estabelecer uma proibição total e indiscriminada de emitir vistos de curta duração, algo que a porta-voz da Comissão Europeia, Anitta Hipper, reafirmou durante o briefing de 9 de agosto. Além disso, parece que não se importam com o facto de que qualquer discriminação na emissão de vistos constitui uma violação flagrante dos direitos humanos básicos consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da UE (o Artigo 21º proíbe a discriminação por razões étnicas ou outras).
Vale também a pena recordar que as nações integrantes da OSCE, incluindo todos os membros da União Europeia, assumiram voluntariamente, no século XX, os compromissos de garantir a liberdade de locomoção em todo o continente europeu. Este compromisso está também claramente enunciado no Artigo 12º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis, que protege o direito de todos à liberdade de circulação dentro de um Estado, e a liberdade de deixar qualquer país e regressar ao seu país. Finalmente, novidades legislativas deste gênero vão contra as declarações dos representantes da UE de que as restrições impostas à Rússia não visam cidadãos comuns.
Estamos confiantes de que quaisquer tentativas de isolar a Rússia com uma nova “cortina de ferro” por razões da conjuntura política, destruir assim o espaço humanitário europeu comum criado ao longo da história recente e dificultar milhares de laços pessoa-a-pessoa, não serão apoiadas pela população dos países da UE e da Ucrânia. É tempo de pensarem se devem continuar a apoiar os políticos que fazem declarações chauvinistas as quais terão certamente consequências. Terão de responder pelas suas palavras.