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Declaração e respostas a perguntas da comunicação social do Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, na conferência de imprensa conjunta com o Ministro das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos de Moçambique, Carlos Mesquita, Maputo, 31 de maio de 2023

1056-31-05-2023

Senhor Ministro,

Senhoras e Senhores,

Gostaria de agradecer ao Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, e ao Ministro das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos da República de Moçambique, Carlos Mesquita, o caloroso e cordial acolhimento de que fomos alvo.

O Ministro Carlos Mesquita fez um relato pormenorizado das nossas extensas conversações que mostraram a disponibilidade das partes para desenvolver a cooperação bilateral em todos os domínios.

O Presidente Filipe Nyusi reafirmou que Moçambique tem como objetivo prioritário desenvolver as relações com a Federação da Rússia que remontam aos primórdios da época em que a luta pela descolonização ainda estava em curso. Após a independência de Moçambique, o nosso país deu um grande contributo para a sua afirmação como Estado e o desenvolvimento da sua economia e dos seus laços sociais.

Reafirmámos a solidariedade da Rússia para com os seus amigos moçambicanos. Destacámos o nosso apoio aos esforços que o Presidente e o seu Governo estão a envidar para estabilizar a situação no país e, sobretudo, fazer frente à ameaça terrorista.

Destacámos que as trocas comerciais apresentam uma boa dinâmica, tendo crescido mais de 10% em 2022. No entanto, os números absolutos estão abaixo do potencial dos nossos dois países.

Salientámos a necessidade de aproveitar o mais possível o potencial da Comissão Intergovernamental Rússia-Moçambique de Cooperação Económica, Científica e Técnica. Esta reuniu-se em novembro de 2022 e aprovou resoluções para alargar o âmbito da nossa cooperação.

Várias empresas russas mostram interesse pelo mercado moçambicano, entre elas estão a empresa Kamaz, a Inter RAO-Export e a Turbnaia Metallurgicheskaia Kompania. Estamos agora a ponderar atrair os nossos empresários para a concretização de grandes e interessantes projetos estruturais em Moçambique.

Reiterámos o convite a Moçambique para o Fórum Económico Internacional de São Petersburgo, que se realizará em junho próximo. Este evento proporciona boas oportunidades para contactos diretos entre empresários em que surgirem, não raro, ideias promissoras e mutuamente vantajosas.

Concordámos em preparar a terceira reunião do grupo de trabalho para a cooperação técnico-militar, cujos trabalhos foram interrompidos devido à COVID-19. Para dar continuidade à boa experiência que tivemos, dispomo-nos a fornecer aos nossos amigos moçambicanos os produtos militares de que necessitam, incluindo os que se destinam a aumentar a sua capacidade defensiva e a reforçar as suas capacidades antiterroristas.

Tendo em conta o interesse dos moçambicanos em estudar na Rússia, duplicámos o número de bolsas de estudo para o ano académico que está a findar e temos a intenção de acrescentar mais bolsas para o novo ano académico que terá início em setembro próximo. Para além das instituições de ensino superior, os moçambicanos estão interessados em estudar nos nossos estabelecimentos de ensino médio profissionalizante. O respetivo memorando está pronto para ser assinado pelas partes.

A Rússia presta tradicionalmente assistência humanitária a Moçambique, fornecendo-lhe, principalmente, alimentos através do Programa Alimentar Mundial. Um novo lote de ajuda humanitária chegará a um dos portos de Moçambique nos próximos dias.

Os laços interparlamentares também estão numa alta. A Presidente do Conselho da Federação, Valentina Matvienko, e a Presidente da Assembleia da República de Moçambique, Esperança Bias, trocaram visitas em 2022. Por iniciativa da Rússia, os laços interpartidários receberam um novo impulso. Está a ser preparado um "Fórum de apoiantes da luta contra as práticas modernas do neocolonialismo". O evento terá lugar em outubro próximo, sendo o Partido Frelimo membro do comité organizador.

Registamos uma grande convergência de posições sobre as questões internacionais. Nós, como os nossos amigos moçambicanos, acreditamos não haver alternativa ao direito internacional, nem aos princípios da Carta das Nações Unidas nem ao princípio da igualdade soberana dos Estados. Todos eles devem ser aplicados na sua totalidade e interligados entre si.

Não aceitamos nenhumas "regras" inventadas por Washington para substituir o direito internacional. Em primeiro lugar, ninguém as viu. Em segundo lugar, não fazem qualquer sentido jurídico. Em terceiro lugar, resumem-se a um simples princípio: "vocês devem fazer o que nós dissermos".

Cooperamos estreitamente nas Nações Unidas. Nos anos 2023 e 2024, Moçambique participa no Conselho de Segurança da ONU como membro não permanente. Em março passado, Moçambique exerceu a sua primeira presidência deste órgão principal da ONU.

Falamos a uma só voz sobre a maioria das questões da agenda da ONU e cooperamos na agenda africana no Conselho de Segurança da ONU. Valorizamos a contribuição de Moçambique para os esforços da União Africana e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral no sentido de acalmar a situação em algumas regiões do continente e levar a cabo operações de manutenção da paz. Continuaremos a apoiar as ações dos nossos amigos moçambicanos no Conselho de Segurança das Nações Unidas com base no princípio "soluções africanas para os problemas africanos".

Fizemos um ponto da situação em torno da Ucrânia resultante de anos de política do "Ocidente coletivo" para conter e enfraquecer a Rússia através da expansão da NATO para perto das nossas fronteiras, da transformação da Ucrânia numa cabeça-de-ponte antirrussa e da utilização do regime de Kiev para desencadear uma campanha russofóbica grosseira, agressiva e racista.

E, como disse o Ministro Carlos Mesquita, falámos sobre os preparativos para a segunda cimeira Rússia-África, a realizar em São Petersburgo no final de julho próximo. Esperamos uma delegação representativa de Moçambique, chefiada pelo Presidente do país, Filipe Nyusi. Para além dos eventos programados, haverá uma reunião bilateral entre os líderes da Rússia e de Moçambique.

Mais uma vez, gostaria de agradecer aos nossos anfitriões moçambicanos uma reunião profícua e oportuna e uma conversa franca num ambiente de confiança. Ficamos a aguardar novos encontros.

Pergunta: O embaixador dos Estados Unidos na África do Sul, Reuben Brigety, afirmou que o navio russo Lady R teria transportado armas. O que é que acha destas acusações?

Serguei Lavrov: Quer dizer que Moçambique não lhe interessa? A África do Sul é um Estado soberano, tal como a Federação da Rússia. Estamos a construir as nossas relações em total conformidade com as normas e os princípios do direito internacional. Se uma das partes tiver questões a resolver em qualquer das áreas da nossa cooperação, resolvemo-las bilateralmente. Se o embaixador norte-americano ou qualquer outro tem umas miragens, precisa de saber qual é o seu lugar e não se meter nos assuntos dos outros.

Quanto ao tema dos fornecimentos de armas (que, pelo que entendi, lhe interessa), volto a sublinhar que nunca violamos as normas internacionais, enquanto os nossos colegas ocidentais o fazem. Ao declararem neutralidade em relação aos acontecimentos na Ucrânia, estão a fornecer, em grandes quantidades, armas modernas de longo alcance e inseguras para aqueles que as utilizam. Refiro-me aos projéteis de urânio empobrecido. Os ocidentais estão a fornecer armas a um regime cujos responsáveis governamentais têm ameaçado publicamente matar todos os russos. Os embaixadores norte-americanos fariam melhor em melhorar a sua própria imagem no estrangeiro.

Pergunta: Na segunda metade desta semana, haverá uma reunião dos Ministros dos Negócios Estrangeiros dos BRICS na Cidade do Cabo. Que perspetivas tem a referida reunião? A cimeira dos BRICS está também a ser preparada na África do Sul. Qual é a probabilidade de o Presidente Putin participar nesta reunião, tendo-se em conta a conhecida decisão do tribunal internacional?

Serguei Lavrov: Relativamente à reunião ministerial dos BRICS, venha. Provavelmente haverá uma conferência de imprensa. Contar-lhe-emos tudo.

Quanto à decisão do Tribunal Penal Internacional. Para nós, tal como para a maioria esmagadora dos outros países, não tem qualquer força legal. Pode dirigir-se ao embaixador norte-americano a que se referiu ou a qualquer outro lugar para obter esclarecimentos. Quando este "Tribunal Penal Internacional" decidiu subitamente investigar os crimes dos EUA no Afeganistão, o Presidente dos EUA disse que, se eles se atrevessem a fazê-lo, ele iria aplicar sanções contra eles. Ou seja, os próprios norte-americanos cuja opinião o senhor tanto gosta de citar "estão-se nas tintas" para este "organismo". Se agora alguém, em particular, que fala bem inglês, decidiu utilizar esta "ferramenta" contra a Rússia, gostaria de referir mais uma vez a inaceitabilidade das regras usadas pelo Ocidente para tentar resolver as questões internacionais exclusivamente a seu favor, a exemplo das potências coloniais que tentaram viver à custa dos outros.

Pergunta: Em 2019, foram assinados cinco acordos de cooperação nos domínios da defesa, segurança, recursos naturais, etc. Como estão a ser concretizados estes acordos?

Serguei Lavrov: Quanto aos acordos nos domínios da defesa e segurança, comércio, económico e humanitário, estão todos a ser cumpridos. A Comissão Intergovernamental Rússia-Moçambique de Cooperação Económica, Científica e Técnica está a funcionar, está a ser preparada mais uma reunião do grupo de trabalho para a cooperação técnico-militar e estão a ser desenvolvidos laços no domínio da educação. Mencionámos isto nas nossas declarações.

Pergunta: Como é que a Rússia avalia a neutralidade da liderança de Moçambique à luz dos apelos lançados no sentido de diálogo?

Serguei Lavrov: Valorizamos e respeitamos a visão ponderada e equilibrada de Moçambique que quer elaborar a sua posição por si próprio. Depois de o Ocidente ter apoiado o golpe de Estado na Ucrânia, explicámos, durante muitos anos, a perniciosidade da política com vista à transformação daquele país numa cabeça-de-ponte antirrussa e à sua atração para a NATO em detrimento da segurança da Federação da Rússia.

Explicámos pormenorizadamente as causas da operação militar especial, bem como a razão por que esta não teve alternativa. O Ocidente condenou as nossas ações. O resto do mundo, o Sul Global e a Maioria Mundial ouviram os ocidentais e a nossa posição. Se os colegas ocidentais são muito democratas, devem deixar que o resto do mundo tenha a sua opinião sobre o que está a acontecer. Eles conhecem os argumentos da Rússia e a posição do Ocidente.

Em todas as nossas reuniões aqui e noutros países onde nos deslocamos, bem como durante os nossos contactos com as pessoas que nos vêm visitar, a questão ucraniana é certamente abordada. Expomos as nossas visões e a nossa posição. O Ocidente, como todos sabemos muito bem, não apresenta nenhumas visões especiais. Dizem que a Rússia é um país agressor e que os outros países devem condená-la, votar como eles dizem, aderir às sanções, não contactar nem fazer comércio com a Rússia, não comprar nada à Rússia e não vender à Rússia. Por outras palavras, nós esclarecemos e respeitamos o intelecto dos nossos interlocutores, acreditando que eles são capazes de fazer conclusões sozinhos. Tal não é o caso do Ocidente que não mostra esse respeito e exige que todos façam o que ele diz. É evidente que isto não é nada democracia, mas um verdadeiro diktat. Grosso modo, o Ocidente "está-se nas tintas" para o princípio da Carta das Nações Unidas sobre a igualdade soberana de todos os Estados.

Como as nossas conversações de hoje mostraram, os nossos amigos moçambicanos estão entre os países que elaboram a sua posição por si próprios, ouvem o que lhes é dito, mas decidem por si próprios e não cedem a chantagens e ultimatos grosseiros.

Pergunta: Como é que vê o fim do conflito russo-ucraniano, se os russos e os ucranianos são irmãos?

Serguei Lavrov: Relativamente às perspetivas de fim do conflito em torno da Ucrânia. Já explicámos os objetivos a atingir. Não podemos aceitar que nas nossas fronteiras esteja um regime que, de um modo geral, está a ser utilizado para repetir a agressão da Alemanha nazi contra o nosso país.

Durante a Segunda Guerra Mundial, Hitler uniu praticamente todos os países europeus sob as suas bandeiras para levar a cabo uma "marcha para Leste" ("Drang nach Osten"). Na situação atual, os EUA também uniram praticamente toda a Europa e fizeram-na pagar as despesas com o fornecimento de armas ao regime de Kiev para que este lute contra a Federação da Rússia. O Presidente Vladimir Zelensky, que professa uma ideologia abertamente nazi e está a implantar práticas nazis na Ucrânia e as bandeiras sob as quais Hitler lançou as suas tropas e as de outros países contra a União Soviética, está a ser utilizado como símbolo desta luta.

Aqueles de entre vocês que prestam muita atenção à Ucrânia podem perguntar pelas leis que foram aprovadas ali nos últimos anos. Entre elas estão as que proíbem o ensino em russo em todas as escolas e os meios de comunicação social russos e ucranianos que transmitem em russo. Podem ver que todos os laços culturais entre os nossos países estão proibidos, à semelhança do que foi feito na Alemanha nazi. Os livros de escritores russos em russo estão agora a ser retirados das bibliotecas ucranianas às centenas de milhares e destruídos.

Não deve haver ali nada disso nem daquilo que caracteriza hoje o regime nazi de Kiev.

Pergunta: Nos seus discursos (e hoje também), aborda frequentemente o tema da divisão entre o "Ocidente coletivo" e a "maioria global", os países do Sul, do Leste e alguns países do Norte. Como é que as pressões do Ocidente a que se referiu são vistas no continente africano?

A posição de neutralidade adotada por alguns países africanos está a manter o status quo do diktat ou a mudar gradualmente o sistema internacional à sua maneira?

Serguei Lavrov: No mínimo, estamos a verificar um evidente cansaço da "maioria global" face ao "assédio" por parte do "Ocidente coletivo", que se está a tornar cada vez mais grosseiro e descarado. O Ocidente exige que os países africanos assumam uma posição antirrussa, deixem de manter a cooperação mutuamente vantajosa com o nosso país. Não prometem nada de bom em troca, prometendo apenas que não os punirão. Esta é toda a verdade.

Muitos países, para fugir a este "assédio" e "perseguição" nos fóruns internacionais, aceitam votar de acordo com as regras ocidentais. Em contrapartida, decidem não apoiar quaisquer sanções. Continuam a interação prática com a Rússia, durante a qual nós e os nossos parceiros encontramos formas de proteger as nossas relações comerciais, económicas e de investimento das sanções ilegítimas que o "Ocidente coletivo" impõe, ignorando completamente os princípios por ele usados para construir o seu modelo de globalização, propagandeando-a em todo o mundo como a melhor forma de desenvolver as relações económicas mundiais.

As sanções promovidas pelo Ocidente contra a Rússia, bem como contra a China e outros países (refiro-me ao Irão e à Venezuela), alguns países africanos, visam fazer com que o Ocidente continue, como era hábito dos colonizadores, a viver à custa dos outros, eliminando concorrentes fortes por métodos sujos e desleais. A África não quer voltar à época colonial, nem quer viver a época neocolonial. Quer tirar o máximo partido dos recursos naturais de que dispõe. Não apenas comercializar matérias-primas, que são exportadas desde há séculos, mas utilizá-las para fabricar produtos que tenham valor acrescentado e procura. Estamos prontos a ajudar os nossos amigos africanos neste domínio.

Hoje, a África está incomensuravelmente mais consciente da sua identidade. É cada vez mais insistente na exigência de um lugar igual para si na ordem mundial multipolar que está a tomar forma, incluindo através de uma representação devida no Conselho de Segurança das Nações Unidas. A Federação da Rússia apoia-a.

Pergunta: Enquanto estamos a viajar por este fantástico continente, a situação é turbulenta no nosso país. À luz do mais recente ataque de drones a Moscovo e do constantemente anunciado contra-ataque ucraniano a posições russas, como avalia os perigos de novas entregas ocidentais de armas de longo alcance à Ucrânia?

Serguei Lavrov: No que diz respeito às atividades terroristas do regime de Vladimir Zelensky e aos mais recentes ataques a cidades russas, o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo fez ontem uma declaração oficial detalhada. Não a vou repetir.

O Ocidente está a fornecer armas de alcance cada vez maior ao regime ucraniano, dizendo ao mesmo tempo, como se estivesse a pedir desculpas, que não está a encorajar ataques contra território russo - isto é uma mentira. Sabe-se que um dos principais "marionetistas" que estão a incitar o Ocidente a apoiar a Ucrânia de forma cada vez mais aberta e séria, é Londres. O Ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, James Cleverly, afirmou, há dias, na televisão e nas redes sociais que o Reino Unido não encoraja ataques em território russo propriamente dito, mas as autoridades e as forças armadas ucranianas sabem melhor como podem garantir a integridade territorial do seu país. É um incitamento direto ao que os terroristas de Kiev estão a fazer.

Quanto às consequências desta política criminosa, esta questão está a cargo das nossas forças armadas. Estou certo de que têm respostas para todas as perguntas.

Pergunta: Na semana passada, o Ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano, Dmitro Kuleba, visitou Moçambique e, após as conversações, afirmou que os dois países concordaram em intensificar a cooperação bilateral. Disse também que, em breve, seria aberta uma embaixada ucraniana em Moçambique. Qual é a atitude da Rússia para com estas iniciativas de Kiev? Foram abordadas na reunião de hoje? Em caso afirmativo, como?

Serguei Lavrov: Não é a mim que deve dirigir esta questão. Esta questão diz respeito às relações moçambicanas e ucranianas.

Respeitamos o direito de qualquer Estado de contactar com os seus colegas de diferentes regiões do mundo. Ao contrário dos norte-americanos, ingleses, europeus, australianos, japoneses que "correm" pelo mundo, tentando persuadir os outros países a não contactar com os russos. Somos um povo bem-educado. Não nos permitimos tais grosserias. Esta questão diz toda respeito às relações moçambicano-ucranianas.

 

 

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