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Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, discursa e responde a perguntas de jornalistas em conferência de imprensa conjunta com a Secretária-Geral da OSCE, Helga Schmid, Moscovo, 21 de junho de 2021

1246-21-06-2021

Senhoras e senhores,

Tivemos conversações concretas, prolongadas e proveitosas. O nosso diálogo foi construtivo e significativo. Como sabem, esta é a primeira visita de Helga Schmid a Moscovo desde que foi nomeada para o alto cargo de Secretária-Geral da OSCE. 

Conhecemos Helga Schmid como diplomata experiente, boa profissional e temos esperança no prosseguimento dos nossos contactos na sua nova qualidade de Secretária-Geral da OSCE. Esperamos que a nossa cooperação seja produtiva, inclusive em termos de melhorar a situação na OSCE, que não se encontra na sua melhor fase de desenvolvimento. Temos uma visão comum sobre a necessidade de melhorar o trabalho da Organização. 

Concordamos que, devido ao seu amplo âmbito geográfico e atitude abrangente para com a segurança em todas as suas dimensões e também devido à regra do consenso, a OSCE é bem capaz de desempenhar um papel mais importante nos assuntos internacionais e, claro, sobretudo na região euro-atlântica. A Rússia está convencida de que, para que isto aconteça, é necessário fazer ressurgir a cultura de diálogo mutuamente respeitoso e igual e de procura de compromisso, outrora inerente à Organização.

Infelizmente, nem todos os integrantes da OSCE partilham esta visão. Citámos exemplos que mostram que os desequilíbrios geográficos e temáticos nas atividades das estruturas executivas da Organização se mantêm. Herdámo-los dos anos 90 do século passado, caracterizados pelas tentativas de dividir os países do espaço pan-europeu em "professores" e "estudantes".  Claro que este é um caminho do nada e que todos estes desequilíbrios precisam de ser corrigidos, o mais rapidamente possível. 

Na mais recente reunião do Conselho Ministerial da OSCE, realizada em Tirana nos dias 3 e 4 de dezembro de 2020, a Rússia propôs tornar sistémicos os debates das vias para melhorar a eficácia da OSCE. A ideia não é rever os princípios fundamentais e os compromissos básicos, mas devolver à OSCE o seu propósito original como estrutura pan-europeia básica para a discussão e adoção de decisões coletivas sobre a segurança nas suas dimensões político-militar, económica e ambiental e humanitária.

Esperamos que as nossas conversações de hoje tenham sido úteis à Secretária-Geral e à sua equipa no que se refere à continuação dos esforços para a busca de pontos de contato entre as diferentes ideias de melhorar a eficácia da OSCE.

Discutimos detalhadamente os desafios atuais nas três dimensões das atividades da OSCE, o funcionamento das suas instituições especializadas e das suas missões de campo. Abordámos questões administrativas, orçamentais e de pessoal. Aqui também há muitos problemas.

A Rússia reiterou-se disposta a trabalhar de forma construtiva na OSCE em áreas como o combate ao terrorismo, ao tráfico de droga, às ameaças em matéria de tecnologias da informação e comunicação, ao crime organizado e o tráfico de seres humanos. 

Somos de opinião de que a OSCE deve encontrar o seu nicho no combate às graves consequências económicas da pandemia do coronavírus, elaborando, inclusive, medidas para apoiar as indústrias mais afetadas, garantir os direitos sociais e económicos da população e reforçar a interdependência do comércio e dos transportes no espaço euro-asiático. No plano humanitário, as nossas prioridades incondicionais continuam a ser a defesa dos direitos das minorias étnicas referentes, inclusive, ao ensino e à utilização da sua língua materna, a prevenção do neonazismo e do extremismo radical, o combate à cristianofobia e à islamofobia, a defesa dos valores tradicionais.

Discutimos detalhadamente as perspetivas de resolução do conflito interno ucraniano. Só pode ser resolvido mediante a implementação plena e coerente do Pacote de Medidas de Minsk. Este último não tem alternativas. Os participantes no processo Normandia e os outros Estados membros da OSCE têm dito isso várias vezes. Voltámos a salientar a importância de a OSCE ajudar a organizar um diálogo direto entre as partes beligerantes: Kiev, Donetsk e Lugansk, no Grupo de Contacto. As autoridades ucranianas estão, por enquanto, a tentar evitá-lo. 

Defendemos a necessidade de aumentar a eficácia da Missão Especial de Monitorização da OSCE (SMM) na Ucrânia. Recordámos que esta deveria denunciar clara e imparcialmente as violações do cessar-fogo, reagir sem delongas e registar nos seus relatórios todos os casos de morte e ferimento entre os civis em Donbass, identificando o culpado. 

Gostaria de recordar o seguinte: no final de 2020, a SMM publicou finalmente um relatório sobre as baixas civis do conflito (entre 1 de janeiro de 2017 e 15 de setembro de 2020). O relatório confirma de forma clara e extremamente convincente um facto que nos tem sido óbvio durante muitos anos: a população civil de Donbass sofre principalmente com as ações de Kiev. O número de vítimas de bombardeamentos ucranianos registado é três vezes maior do que o de vítimas do fogo de retaliação no território controlado pelo governo ucraniano. Aguardamos a publicação de um documento semelhante referente a todo o período do conflito e um relatório sobre a destruição de infraestruturas civis e manifestações de nacionalismo e neonazismo agressivo na Ucrânia. 

Entre as competências da SMM está a monitorização da observância dos direitos humanos em toda a Ucrânia. No entanto, não é raro a Missão menosprezar esta sua função. Penso que o primeiro passo imediato deveria clarificar todos os factos que estou a mencionar. A SMM deve estar plenamente consciente da sua responsabilidade de comunicar de forma clara e verdadeira estes factos à Organização e à comunidade internacional.

Trocámos pontos de vista sobre o andamento dos processos de paz em Nagorno-Karabakh e na Transdniestria e das Discussões de Genebra sobre a Segurança e Estabilidade na Transcaucásia. Abordámos alguns aspetos das atividades das missões de campo da OSCE na Ásia Central e nos Balcãs.

Desejámos à Secretária-Geral da OSCE reuniões construtivas no Conselho da Federação e na sede da OTSC, e uma boa participação na 9ª edição da Conferência de Moscovo sobre a Segurança Internacional organizada pelo Ministério da Defesa da Federação da Rússia. Sublinhámos que a cooperação frutuosa da OSCE deveria ser projetada sobre todas as estruturas regionais que se encontram na área da sua responsabilidade. Refiro-me à UE, NATO, OTSC e outras estruturas regionais, conforme o que foi acordado na cimeira de há muitos anos da Organização. 

Creio que as nossas conversações foram muito proveitosas. Gostaríamos de desejar à Sra. Schmid um bom trabalho no seu novo emprego em geral e durante a sua estadia em Moscovo, para implementar a sua agenda cheia e muito útil. 

Obrigado!

Pergunta (endereçada a Helga Schmid): Gostaria de chamar a sua atenção para a situação relativa aos direitos dos jornalistas na Letónia, onde mais de dez dos meus colegas jornalistas estão sob investigação criminal há dois anos. Tiveram as suas casas revistadas e o seu equipamento, documentos e cartões bancários apreendidos e foram obrigados a assinar compromissos de não deixar o país. Estão a ser processados por terem colaborado com as agências noticiosas russas Sputnik e Baltnews. Formalmente, são acusados de terem violado um "regime de sanções", embora nem os jornalistas em questão, nem as agências Baltnews e Sputnik estejam sob quaisquer sanções.

Trata-se de uma perseguição política. A minha avaliação é a seguinte. Estão a ser perseguidos pela sua posição e trabalho jornalístico. A minha pergunta é: a OSCE tem um mecanismo efetivo para defender os direitos dos jornalistas em situações como esta? A OSCE tem a possibilidade de tomar sob o seu controlo a situação que descrevi na Letónia e fazer com que esta seja resolvida com base nos princípios da Organização?

Serguei Lavrov (acrescentado depois de Helga Schmid): Discutimos este tópico nas nossas conversações. A Sra. Schmid havia dito exatamente o que acaba de dizer agora. Não posso dizer que concordo com ela. No mínimo, a questão de como as sanções da União Europeia afetam a liberdade dos meios de comunicação social merece uma discussão à parte na OSCE. Tanto mais que não é claro por que razão foram instaurados processos de natureza penal pelas "falhas" cometidas, segundo a UE, pelos jornalistas da Sputnik e da Baltnews. 

Não abandonámos este tópico. Permanece em cima da mesa das negociações com a OSCE, com a nova Representante Especial da OSCE para a Liberdade dos Meios de Comunicação Social, Teresa Ribeiro, que em breve visitará a Federação da Rússia. 

A questão do número de meios de comunicação social em língua russa que operam num determinado país deve ser estudada para saber o tipo dos media em questão e quem é o seu proprietário. 

Repito, nós discutimos este assunto. Para nós, este tema não está encerrado. A persecução criminal contra os jornalistas não pode ser justificada por nenhumas estatísticas.

Pergunta: Armênia realizou eleições legislativas. Como os seus resultados podem influenciar a estabilidade em Nagorno-Karabakh e na região em geral?

Serguei Lavrov: As eleições acabam de se realizar. Ainda não é claro como os seus resultados irão impactar a situação política nas novas condições. Vamos aguardar que o novo governo seja formado. 

Entendemos que o acordo tripartido, de 9 de novembro de 2020, que pôs fim à guerra, bem como o acordo, de 11 de janeiro de 2021, que lançou o processo de ajustamento de formas concretas da retomada das atividades económicas e de levantamento do cerco são do interesse de todas as partes envolvidas.

Pergunta (endereçada a Helga Schmid): A senhora referiu que os acordos de Minsk são a base para a solução do problema na Ucrânia. O que pode a OSCE fazer hoje para forçar a liderança ucraniana a cumprir estes acordos?

Serguei Lavrov (acrescentado depois de Helga Schmid): Discutimos este tópico. As pessoas estão a sofrer. Uma vez mais, chamei a atenção para o facto de a cimeira do formato Normandia, em Paris, em dezembro de 2019, ter examinado um documento acordado por peritos, assistentes dos líderes e submetido para aprovação. O primeiro item foi a retirada de forças e equipamento e a retirada de material de guerra pesado ao longo de toda a linha de contacto em Donbass. Esta disposição foi acordada e até assinada. Vladimir Zelensky recusou-se a aceitar este ponto concreto, que, como diz agora Helga Schmid, é crucial para a segurança e o bem-estar das pessoas. Pronunciou-se para que a retirada só fosse efetuada em três locais que continuam a ser acordados até agora. Por outras palavras, em vez de resolver este problema de uma vez por todas e garantir a segurança das pessoas de ambos os lados da linha de contacto, Vladimir Zelenski fez com que este problema se mantivesse e se agravasse. 

Pergunta (endereçada a Helga Schmid): O Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano disse recentemente que chegou a um acordo com a Turquia sobre a cooperação na área militar. Com isso, não se exclui a hipótese de exercícios navais destes dois países no Mar Negro. Isso ajudará a manter a estabilidade na região onde a situação é tensa? 

Serguei Lavrov (acrescentado após Helga Schmid): Declarámos de forma muito clara e inequívoca a nossa posição sobre as tentativas de puxar a Ucrânia para a NATO. Não temos dúvida de que os Estados sérios e responsáveis compreendem muito bem do que se trata. Mantemos um diálogo regular com os nossos colegas turcos. Está previsto para breve outro contacto. Penso que abordaremos também este assunto. 

Pergunta: A Casa Branca disse, após a Cimeira de Genebra, que tencionava continuar a prestar ajuda humanitária à Síria. O senhor pode concordar com a renovação do mandato da ONU nesta área?

Serguei Lavrov: O lado norte-americano levantou esta questão. Gostaria de recordar que, neste momento, o único local através do qual a ajuda humanitária externa chega à Síria sem a participação do Governo sírio (como exigido pelo direito humanitário internacional) é o local de entrada na província de Idlib. Ali, apesar dos esforços intensos dos nossos colegas turcos, o papel decisivo pertence à organização terrorista Hay’at Tahrir al-Sham que mantém muitos civis reféns. Evidentemente, é necessário que lhes seja prestada ajuda humanitária. O Governo sírio está disposto a fazê-lo sem qualquer exceção dos princípios do direito humanitário internacional.

Desde abril de 2020 (há mais de um ano), o Governo sírio dispõe-se a fazer seguir comboios humanitários para civis de Idlib através de Damasco. Infelizmente, os nossos colegas das Nações Unidas e os que têm um ponto de vista diferente não conseguiram, até agora, chegar a acordo sobre esta atitude tão óbvia e totalmente legítima. Repito, estamos interessados em ajudar a resolver os problemas humanitários. Contudo, não devemos esquecer que, para além deste local de entrada no território da província de Idlib controlado pelos terroristas, há coisas ainda mais graves que fazem sofrer a população civil da Síria. Tenho em mente a "Lei César" "sufocante", aprovada pelos EUA e diretamente destinada a impedir quaisquer contactos que possam, de alguma forma, ajudar a restaurar as infraestruturas da Síria e o bem-estar humanitário da sua população; a ocupação ilegal pelas forças americanas da margem oriental do rio Eufrates, onde os hidrocarbonetos e outras riquezas naturais da Síria estão a ser pilhados. Com o dinheiro assim obtido são financiados projetos que são vistos por muitos como destinados a encorajar o separatismo e a provocar a desagregação do Estado sírio único. 

Outra coisa que tem um impacto muito maior na população civil deste país é a política do Ocidente, da União Europeia e dos Estados Unidos para o regresso dos refugiados. Toda a ajuda que o Ocidente organiza (sem qualquer participação de Damasco, em violação das regras da ONU) tem por objetivo não tanto criar condições para que os refugiados possam regressar e beneficiar dos serviços mais elementares como ensino, luz e água, como fazer com que os refugiados permaneçam nos campos de refugiados da Jordânia, Turquia e Líbano durante o mais tempo possível. Se o conjunto destes fatores é reconhecido como afetando a situação humanitária na Síria, estamos prontos a discuti-lo. Para o efeito, os nossos parceiros ocidentais devem deixar de interpretar unilateralmente problemas e reconhecer a sua responsabilidade pela situação humanitária geral na Síria.

Pergunta (endereçada a Helga Schmid): Com a aprovação das autoridades oficiais, na Ucrânia, parou praticamente o diálogo não só com as repúblicas não reconhecidas da região de Donbass, mas também com o seu próprio povo. Mais precisamente, com a parte da população que não aceita alguns aspetos da política das atuais autoridades. Refiro-me ao encerramento de três canais de televisão por razões inventadas. Como é que a OSCE encara esta situação? Qual é a sua atitude para com esta política da administração Zelensky? A senhora acha que isto demonstra o seu desejo de encontrar uma saída da situação criada ou as suas tentativas de agravar ainda mais a situação?

Serguei Lavrov (acrescentado depois de Helga Schmid): Estamos à espera da Representante para a Liberdade dos Meios de Comunicação Social, Teresa Ribeiro. A propósito, informámo-la sobre este facto escandaloso. Ela ainda não reagiu.


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