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Principais pontos do briefing proferido pela porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Maria Zakharova, Moscovo, 3 de maio de 2023

840-03-05-2023

Ponto da situação na crise da Ucrânia

 

Anteontem, dia 1 de maio, todo o mundo civilizado celebrou o Dia da Primavera e o Dia do Trabalhador, o Dia Internacional da Solidariedade dos Trabalhadores, dos Operários e dos Sindicatos.

Até recentemente, este Dia também era celebrado na Ucrânia. No entanto, em fevereiro deste ano, o 1º de Maio foi abolido como "vestígio da época soviética", no âmbito da política de "descomunização". Parece que o regime de Kiev não compreendeu que este feriado é anterior à fundação da União Soviética (falando da história e da forma como é interpretada e do que o regime de Kiev está a fazer neste domínio). O feriado foi criado em julho de 1889 pelo Congresso de Paris da I Internacional em homenagem ao protesto dos trabalhadores de Chicago realizado e 1 de maio de 1886 e continua a ser celebrado em muitos países de todo o mundo, entre os quais os países da UE, à qual a Ucrânia está tão ansiosa por aderir. A propósito, o Dia do Trabalhador também é celebrado nos EUA e no Canadá, embora as comemorações sejam realizadas na primeira segunda-feira do mês de setembro e não no dia 1de maio.

No entanto, este facto não tem nenhuma importância para o regime de Kiev que interpreta a história conforme com o seu humor. No seu desejo maníaco de reescrever a história, o regime de Kiev está pronto para fazer qualquer coisa. Empenha-se em "recodificar”, custe o que custar, a consciência de milhões de cidadãos do seu país ou de pessoas que se associam à Ucrânia para implantar nas suas mentes ideias de excecionalismo nacional, superioridade e não-identidade. De que identidade se pode tratar se tudo o que era querido ao povo ucraniano foi espezinhado no ardor desta bacanal política? Afinal, é muito mais fácil para Vladimir Zelensky controlar a população zombificada e usá-la como “bucha de canhão”, do que cumprir as suas promessas eleitorais: trabalhar em benefício do povo, preservar a verdadeira identidade do povo do seu jovem país. Esta é a verdadeira face da "democracia ucraniana", por detrás da qual está Washington. Os direitos dos trabalhadores, tal como os direitos humanos, são há muito uma conha vazia na Ucrânia. Não posso deixar de dizer que, ao celebrar o Primeiro de Maio, Vladimir Zelensky estava (na minha opinião) muito mais próximo do Ocidente do que poderia imaginar, e ainda mais do que está agora. Isto foi um esboço. Agora vamos ao mais importante. Privando as pessoas do seu direito mais importante - o direito à vida - o regime de Kiev continua a bombardear cidades russas pacíficas.

A cidade de Donetsk, submetida às maiores provações durante os nove anos de agressão do regime de Kiev contra a população russófona do Donbass, está a sofrer muito os bombardeamentos. Todos os dias há relatos da morte de crianças, mulheres e idosos assassinados pelos militares ucranianos, não falando sequer dos homens que defendem o Donbass. Este é um traço marcante do regime de Kiev. Para eles, não há nenhuma diferença, não porque valorizem mais a vida dos civis, mas porque não a valorizam de todo. Os projéteis de fabrico ocidental lançados pelos militares ucranianos atingem edifícios residenciais e civis nas ruas. A 28 de abril passado, os neonazis ucranianos lançaram um ataque com mísseis contra o centro da capital da República Popular de Donetsk. Mais uma vez, utilizaram os Hymars norte-americanos. Sete pessoas, entre as quais uma criança, foram mortas após um impacto direto de um míssil num miniautocarro. Onde está a reação do Ocidente? Já a viram? Lembram-se de como os ocidentais usaram como símbolo do humanismo as imagens de crianças sírias? Fotos e vídeos de crianças a sofrerem na Síria correram Londres, Paris e Berlim na altura, fazendo parte das campanhas eleitorais e da retórica dos políticos dos países da UE e da NATO. Depois descobriu-se que tudo isso era uma encenação ou uma hipocrisia colossal. Aqui as crianças morreram na realidade. Alguém ouviu alguma reação? Pode ser que tenhamos deixado passar despercebido o facto de ter havido um debate no parlamento britânico sobre este assunto ou de o Primeiro-Ministro do Reino Unido ter ido ter com os legisladores e ter explicado a razão por que o regime de Kiev (patrocinado pelo Reino Unido, entre outros) está a matar crianças? Não ouvimos nada disso. Os britânicos disseram cinicamente que há muito que fornecem projéteis com urânio empobrecido ao regime de Kiev, como se se tratasse de uma espécie de "ajuda humanitária". Os senhores querem que eles expliquem razões? Nunca o fizeram. Outras dez pessoas ficaram feridas no Centro de Trauma do Donbass que está no local atingido. Talvez alguém tenha dito algo sobre isso em França? Ou algumas associações de jornalistas de investigação se tenham pronunciado a este respeito? Claro que não.

Os militares ucranianos não titubeiam em usar minas, meios mais cruéis, para matar civis: há dias, em Donetsk, quatro crianças foram atingidas por uma mina ucraniana. Destas, duas se encontram em estado grave. Alguém sabe disso em Espanha, Portugal e Itália? Ou os seus meios de comunicação social estão proibidos de ver, ouvir e saber tudo o que se passa? E os países nórdicos da Europa, que gostam tanto de mostrar simpatia pelas vítimas dos conflitos, dar-lhes autorizações de residência, apoiá-las e nomeá-las para os mais diversos prémios? Acham que estas crianças não merecem prémios? Na verdade, não querem saber de prémios, querem apenas sobreviver, como fizeram nos últimos oito anos. Mas isso, como se costuma dizer, é outra coisa. Isso não interessa a ninguém. Isto não se harmoniza com o quadro pintado pelos jornalistas dos Grandes Média a mando de Washington. Tudo isto tem como pano de fundo numerosos eventos intermináveis em Nova Iorque, Genebra e outras capitais ocidentais, organizações internacionais e fóruns internacionais dedicados à liberdade de expressão, aos direitos dos jornalistas, à luta contra as falsificações e à imparcialidade dos meios de comunicação social. De que imparcialidade, direitos dos jornalistas e liberdade de expressão se pode tratar se ninguém, a não ser nós, fala disso? É de lamentar. Se alguém pensa que não entregamos materiais a organizações especializadas, representantes especiais, escritórios de representantes plenipotenciários de organizações internacionais ou às próprias organizações internacionais, está iludido. Fazemo-lo todos os dias. Além disso, chamamos a atenção para o facto, a fim de despertar de alguma forma a opinião pública internacional. Neste caso, estou a falar principalmente do Ocidente. Os ocidentais vivem em estado letárgico, não vendo nada a não ser ilusões criadas pelos Grandes Média. Não ouvem nenhuma palavra da verdade. Na Ásia, em África e na América Latina ainda existe jornalismo alternativo que não sucumbiu à pressão do Ocidente coletivo no espaço mediático. Lá ainda se pode ver e ouvir alguma coisa. Quanto aos países pós-soviéticos, embora cubram a situação de forma desigual, a voz da verdade está a irromper. Em relação aos países da CEI, da OTSC e de outras associações de integração, informamos os nossos parceiros praticamente todos os dias. Enviamos-lhes os dados que vêm ao nosso conhecimento todos os dias no intuito de fazer com que cheguem, a certa altura, à sua consciência que ainda está adormecida, mas que ainda existe. Os militares ucranianos estão a intensificar as suas atividades terroristas e de sabotagem. A 29 de abril, um drone ucraniano atacou um dos tanques de armazenamento de petróleo na Baía dos Cossacos, em Sebastopol. Deflagrou um incêndio. O porta-voz do Departamento Geral de Informações Militares do Ministério da Defesa ucraniano, Andrei Iusov, confirmou, de facto, o envolvimento do regime de Kiev neste crime, dizendo que os ataques à Crimeia iriam continuar. Ele considera isso completamente normal, evidente de per si, como se a Crimeia fosse uma área desabitada ou um campo de treino para os desejos doentios e os caprichos feios do regime de Kiev. Não, na Crimeia há pessoas, há crianças que vão à escola e há gente que trabalha. Em tempos, fugiram do regime de Kiev, porque perceberam onde é que tudo isto ia dar e quem é que está agora à frente da Ucrânia. Os líderes ucranianos deixaram de esconder o que negaram durante muitos anos, ou seja, que querem varrer da face da Terra tudo o que não lhes obedece e não se harmoniza com a sua "visão do mundo". Andrei Iusov aconselhou os crimeanos a não permanecerem perto das instalações militares e de apoio do exército russo. Uma interpretação curiosa. No dia 1 de maio, uma linha elétrica foi feita explodir no distrito de Gatchina, na região de Leninegrado. Um segundo engenho explosivo foi desativado. Naquele mesmo dia, um comboio que transportava combustível, lubrificantes e materiais de construção, proveniente de Gomel, descarrilou na região de Briansk, na sequência de um ato de sabotagem. A locomotiva e vários outros vagões descarrilaram. Por sorte, nenhum dos tripulantes bielorrussos ficou ferido. Gostaria de salientar que hoje as nossas autoridades competentes divulgaram informações adicionais sobre as atividades subversivas da Ucrânia na Crimeia. Prestámos atenção a mais uma tentativa desajeitada do regime de Kiev de transferir para a Rússia a responsabilidade pelas falhas do seu sistema de defesa antiaérea. Na madrugada de 28 de abril passado, ao repelir um ataque russo a alvos militares em Uman, um dos mísseis ucranianos atingiu um edifício residencial, matando 17 pessoas. Infelizmente, tragédias semelhantes já antes tiveram lugar, mas de cada vez as autoridades ucranianas (na verdade, trata-se do regime de Kiev, de um regime terrorista e extremista ilegítimo a tentar comportar-se como se fossem as autoridades da Ucrânia) mentiram descaradamente ao seu povo, com medo de lhe dizer o que na verdade aconteceu. Não imaginam o que eles disseram para justificar as suas ações. Mais cínico ainda é o seu desejo de utilizar o acontecido para fins de propaganda. Em particular, o regime de Kiev apelidou sem pestanejar o já referido ataque terrorista ao depósito de petróleo em Sebastopol de " castigo de Deus pelo acontecido em Uman". E isto é dito por aqueles que travam há muitos anos uma guerra feroz iniciada muito antes da operação militar especial. Há muitos anos que destroem a Igreja Ortodoxa canónica, perseguem os sacerdotes e os sues fiéis, transgridem todas as normas da moralidade humana e os mandamentos de Cristo. Há muito tempo que nada é sagrado para os neonazis ucranianos. Parece-me que tudo se tornou claro após a tragédia de Odessa. Há dias, todos nós que temos memória, consciência e coração, homenageamos as vítimas da tragédia da Casa dos Sindicatos de Odessa. Ouviram o regime de Kiev dizer uma só palavra a este respeito? Algumas organizações humanitárias e internacionais disseram alguma coisa sobre isso? Alguém no Ocidente instou o regime de Kiev a encontrar os responsáveis por essa tragédia? Todos os dias há muitas tragédias e catástrofes de origem tecnológica no mundo, bem como há, infelizmente, manifestações de extremismo e acidentes de todo o género que ceifam um grande número de vidas. Mesmo entre estas tragédias, há as que se distinguem, não tanto pelo número de vítimas ou pela dimensão dos danos, como pelo grau de desumanidade daqueles que as cometeram e daqueles que as aprovaram ou indulgenciaram aqueles que desprezaram a moral e passaram dos limites do permitido. Não há nenhuns apelos, relatórios ou análises, pois esta não é uma campanha propagandística semelhante à feita em Bucha, mas os verdadeiros acontecimentos trágicos ocorridos na Casa dos Sindicatos de Odessa. Durante todos estes anos, desde essa tragédia, a Rússia tem vindo a explicar, citando exemplos concretos nesta sala, em fóruns internacionais, em conferências de imprensa, simpósios e seminários internacionais, até onde esta lógica poderia levar. Estamos agora no ponto a que esta lógica levou: a impunidade absoluta, a imoralidade que afetou todas as esferas da vida sob o regime de Kiev, fazendo coisas terríveis à Ucrânia. É a isto que estamos a assistir agora.

Os países ocidentais não escondem estarem a participar de forma aguerrida nos preparativos de uma contraofensiva ucraniana, do que se tem falado muito ultimamente. Isto passa dos limites do sensato. Está em pleno andamento a campanha de entrega ao regime de Kiev de munições armazenadas na União Europeia. As entregas já feitas avaliam-se em mais de 600 milhões de euros, havendo planos para aumentar esse valor para mil milhões de euros. Os países da UE ponderam aumentar a capacidade da sua indústria de guerra para produzir novos lotes de armas para a Ucrânia. A Alemanha tem sido especialmente ativa ultimamente. O Ministro da Defesa alemão, Boris Pistorius, anunciou a entrega de mais 80 tanques Leopard-1 ao regime de Kiev até meados deste ano. Num futuro próximo, a Alemanha começará a treinar mais de 100 militares ucranianos no uso dos Leopard. Não é segredo de que tipo de blindados se trata e contra quem será usado. O objetivo do treino oferecido aos militares ucranianos não é um exercício militar no âmbito de uma troca de experiências, mas matar humanos na zona de conflito. Mas quem é que, na Alemanha, encara a situação através deste prisma?

Além disso, um lote de 31 carros de combate Abrams de fabrico norte-americano deverá chegar à Baviera até ao final de maio. Dentro de dez semanas, cerca de 250 militares ucranianos receberão treino para os manobrar. Além disso, de acordo com os meios de comunicação alemães, mais de 1000 soldados da força especial ucraniana estão a receber treino em bases militares espalhadas pelo país.

O conselheiro do Gabinete do Presidente da Ucrânia, Mikhail Podoliak, produziu outra série de declarações antirrussas nas redes sociais, ameaçando os seus compatriotas de represálias por obterem voluntariamente a cidadania russa. Ele também afirmou que qualquer ucraniano que tenha obtido um passaporte russo se torna automaticamente alvo legítimo para os militares ucranianos. Isto se aplica apenas aos portadores do passaporte russo? Esta pergunta é para Mikhail Podoliak. E se for descoberto que alguns dos responsáveis governamentais ucranianos têm imóveis, propriedades ou negócios na Federação da Rússia, eles não serão alvo de perseguições? Porquê esta segregação? Porque é que uma pessoa que pode não ter mais nada na vida deve ser punida por ter o passaporte russo, e aqueles que podem ter negócios multimilionários, rendimentos e bens imobiliários no nosso país (destes muitos estão à frente do regime de Kiev) não sofrerão nenhuma represália? Talvez porque podem pagar por não serem perseguidos, porque têm muito dinheiro? Não, assim não dá. Uma vez que não estão dispostos (dirijo-me ao regime de Kiev) a regressar (o que é óbvio) ao quadro da normalidade tradicional, uma vez que este processo, tal como o entendemos, é irreversível para vocês, então, vamos lá, sejam coerentes e digam-nos onde escondem as suas riquezas, em vez de perseguir pessoas comuns que têm vivido as experiências do Ocidente durante muitos anos na Ucrânia. Não é da alta política ou de direitos humanos que estou a falar. Estou a falar da sobrevivência de muitas pessoas.

Ao que parece, Mikhail Podoliak não conseguiu compreender por que razão a população das ex-regiões ucranianas: Crimeia, Repúblicas Populares de Donetsk e de Lugansk, Regiões de Zaporojie e de Kherson, se recusaram a permanecer como parte da Ucrânia e decidiram regressar à sua pátria histórica, a Rússia. Estas regiões não querem ter mais nada a ver com um regime que se está nas tintas para o seu destino e direito de viver, recusando-lhes até a possibilidade de ter um passaporte do país onde podem ter nascido e com o qual têm fortes laços de parentesco. Ao mesmo tempo, alguns representantes do regime de Kiev que lhes nega a possibilidade de ter um passaporte russo têm passaportes alemães ou britânicos outros, certificados de residência permanente ou possibilidades de residir longamente e garantias fornecidas pela Alemanha, Reino Unido, EUA, Canadá, Israel. E estas pessoas proíbem os seus cidadãos de terem uma escolha. Porquê?

O que está a acontecer na Ucrânia leva-nos a crer, mais uma vez, que a operação militar especial foi iniciada oportunamente e, como os dirigentes russos declararam, vai continuar, e os seus objetivos serão atingidos. Como podemos ver, e agora não somos os únicos a ver isso, não há nada de novo nas experiências do regime de Kiev. Diz-se, com razão, que o que há na Ucrânia não é o nazismo, mas o neonazismo, uma repetição e reencarnação das piores práticas do passado recente.

  

Sobre a situação em torno dos gasodutos Nord Stream

 

Continuamos a acompanhar de perto a situação em torno da investigação sobre os atos de sabotagem nos gasodutos Nord Stream em setembro de 2022. Ainda ninguém respondeu à pergunta sobre os responsáveis, nomeadamente devido à aparente falta de vontade política por parte dos principais investigadores da Alemanha, Dinamarca e Suécia de garantir a sua transparência, o que (como afirmámos repetidamente) é impossível sem a participação das autoridades competentes russas e de especialistas da Gazprom. Recorde-se que a carta do Primeiro-Ministro. Mikhail Mishustin, de 5 de outubro de 2022, e as notas do Ministério dos Negócios Estrangeiros ficaram sem qualquer resposta substantiva.

A resposta do Ministério dos Negócios Estrangeiros sueco à nossa nota de 12 de abril passado em que pedimos informações sobre o ponto da situação da investigação dos atos terroristas nos gasodutos e sobre as pessoas envolvidas e exortámos a uma investigação internacional abrangente, com a participação obrigatória de especialistas da Rússia, enviada à Embaixada da Rússia em Estocolmo no final de abril passado foi mais uma prova de que esta posição não construtiva foi assumida de forma consciente. A parte sueca enviou uma resposta formal, limitando-se a referências à troca de correspondências anterior. É um círculo vicioso clássico. Infelizmente, em vez de diálogo, assistimos a um repetido teatro do absurdo. Não podemos persuadir os países envolvidos na investigação a ter uma conversa substantiva connosco e muito menos conseguir a realização de uma investigação nem um estudo da situação, com a nossa participação. Estes países estão a fazer os possíveis para que as suas ações não sejam transparentes. Os meios de comunicação social destes países (principalmente a Alemanha, a Dinamarca e a Suécia), bem como os meios de comunicação social de outros países que os apoiam ativamente nesta matéria, estão a espalhar insinuações russofóbicas infundadas, obviamente a mando dos militares e dos serviços secretos locais. Entre as insinuações mais recentes, consta a informação concedida pelo comando das Forças Armadas dinamarquesas ao jornal "Informationshon" de que o navio de guerra russo "SS-750" teria estado, quatro dias antes do incidente, na zona das explosões do gasoduto, transportando alegadamente equipamento (em particular, um minissubmarino) para efetuar "operações especiais no fundo do mar". Diz-se também que os serviços secretos dinamarqueses (que se mantiveram em silêncio durante todo este tempo. Todavia, passados seis meses, a opinião pública está a exigir esclarecimentos) têm na sua posse fotografias do navio russo a passar na referida região. É lógico supor, e esta é a primeira coisa que qualquer jornalista ou leigo, leitor de uma ou outra publicação, dirá: posso ver? Os serviços secretos dinamarqueses têm a resposta: o comando militar dinamarquês não tenciona tornar públicas essas fotografias. Sabem porquê? Isso não é sequer ridículo. Os serviços secretos dinamarqueses não vão tornar públicas estas fotografias, nas quais baseiam toda a "teoria da conspiração", devido ao seu carácter "sensível". Parece-me ser uma espécie de continuação de "Os KikoRiki”. Obviamente, o objetivo destas falsificações não é apurar a verdade, mas, pelo contrário, tornar a situação ainda mais confusa. Trata-se de uma desinformação clássica: são postos em circulação materiais que não correspondem à verdade para criar a impressão de que, em primeiro lugar, está em curso uma investigação, em segundo lugar, que os organismos competentes (deveriam sê-lo, mas, como podemos ver, não o são) estão a trabalhar (a opinião pública está a exigir, muito dinheiro foi investido nestes projetos, enormes despesas incorridas por todas as entidades envolvidas, os países e os seus povos), em terceiro lugar, para criar muitas versões alternativas. É para isso que foi lançada toda esta "campanha nos mass media”. Gostaria de desmentir as especulações dos nossos colegas da NATO. A informação está disponível ao público. É estranho que não só os jornalistas, mas também a Marinha dinamarquesa não a tenham.

Gostaria de informar os desinformados. A Frota do Mar Báltico russa realizou treinos nas áreas reservadas aos exercícios do Mar Báltico no período de 19 a 24 de setembro de 2022, no âmbito do Plano de Treino Operacional. As forças e o equipamento envolvidos nos treinos não podiam (estou a sublinhar isso duas vezes para todos os que estão na Dinamarca) estar na zona do presumível ataque terrorista ao gasoduto Nord Stream-2, dado que as áreas de treino da Frota russa se situam à grande distância da referida zona. Há que compreender que há factos e dados e que há lacunas colossais na educação. Lembram-se muito bem de como a Ministra dos Negócios Estrangeiros alemã, Annalena Baerbock, disse que existem países que estavam a centenas de milhares de quilómetros de distância uns dos outros. Não existem países assim. Se existem, é preciso dar várias voltas à Terra, dependendo de quantas centenas de milhares de quilómetros de distância esses países estão uns dos outros. Há dados, factos, lógica e, no final de contas, há um grande número de programas de computador e aplicações especiais que podem calcular tudo isto. Além disso, toda esta informação está publicada e disponível ao público. Mas existem estas lacunas. Aparentemente, esta palavra é difícil para os nossos "não-parceiros" ocidentais. Eles também têm lacunas na educação, uma vez que "metem na cabeça” da sua opinião pública todo este disparate publicado pelos seus meios de comunicação social.

Todos os treinos da Frota do Mar Báltico russa foram realizados nas áreas de treino marítimo no sudeste e no centro do Mar Báltico, enquanto as explosões no gasoduto Nord Stream 2 coocorreram perto da Ilha de Bornholm (Dinamarca), na região ocidental do Mar Báltico.

A área em causa (a ilha de Bornholm) situa-se na zona económica exclusiva do Reino da Dinamarca, onde, por definição, estão excluídas quaisquer atividades e ações da Frota do Mar Báltico, de acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. O próprio facto de uma nova "versão" (que é apresentada como sensacionalista) do "envolvimento" da Rússia nas explosões no gasoduto Nord Stream-2 ter aparecido nos meios de comunicação ocidentais mais de seis meses após o incidente é uma prova direta da continuação da campanha de desinformação desencadeada pelo Ocidente para impedir a identificação dos verdadeiros mandantes e autores daquele ato de terrorismo internacional. Os jornalistas que escrevem sobre estes temas na Dinamarca, Alemanha, Suécia (e por aí adiante) fariam melhor em perguntar às suas agências governamentais, serviços secretos e autoridades competentes: "Nos seis meses que se seguiram ao ataque terrorista, foi apenas nos finais de abril, princípios de maio de 2023 que tiveram conhecimento dos exercícios navais declarados e realizados pela Marinha russa no Mar Báltico? Não tiveram acesso a esta informação? Então deveriam ter perguntado às autoridades dinamarquesas para que é que estão então a ser pagas, se deixaram passar despercebida esta informação que foi publicada. Esta pergunta não é apenas para as autoridades dos países mencionados, mas também para os jornalistas que reproduzem tudo isto e não fazem perguntas simples, triviais e elementares. 

 

Resumo da sessão de perguntas e respostas:

Pergunta: O colunista francês C. Roffe afirmou, num artigo publicado no Atlantico, que a taxa de criminalidade aumentou na Europa de Leste devido à venda ilegal de armas na Ucrânia. "Este processo, ignorado pelo exército e pelos media, será longo e perigoso. Este problema não preocupa os estrategas de Washington. Deve preocupar mais os dirigentes europeus, porque toda esta anarquia criminosa continuará a ser problema deles", acrescentou Roffe. Que comentário pode fazer a esta declaração?

Maria Zakharova: Muito obrigada por citar autores, colunistas e jornalistas franceses, mas, para ser sincera, preferia que nos citasse também. Gostaria de dizer que temos vindo a falar sobre este assunto, nomeadamente para onde "irão" e onde "ressurgirão" as armas fornecidas ao regime de Kiev, há mais de um ano que falamos sobre o assunto. Antes disso, também falámos sobre vários aspetos deste problema, há um ano que falamos diretamente sobre o que está a acontecer e o que vai acontecer num futuro próximo. Tudo o que dissemos há muito tempo (e voltamos a este tema todos os dias) tornou-se realidade.

Outra coisa é que nem toda a gente (para dizer o mínimo) no Ocidente quer ver isso. É claro porque é que Washington não o quer ver: é uma parte da sua estratégia para desestabilizar a situação no continente europeu. Isso é óbvio. Não é claro porque é que os funcionários e representantes oficiais, os movimentos políticos que estão no poder nos países da UE e estão cientes disso não querem ver isto. Penso que a resposta é a mesma de sempre: alguns deles são mandatários ou agentes da vontade de Washington, enquanto outros, aparentemente devido à situação política, preferem manter o silêncio, sem perceber até onde a sua posição silenciosa os levará. As armas de todos os tipos (refiro-me também ao material pesado), já estão há muito tempo nos mercados "paralelos" europeus, por mais paradoxal que isso pareça. O que são esses mercados "negros" de armas? Como sabem, não são um "campo de milagres", não são "hortas" ou quintais onde, de uma forma ou de outra, a situação pode ser controlada. O mercado “negro” (se estivermos a falar de armas) está em todo o lado, dado o fator Internet. É uma oportunidade de fazer compras através da tecnologia blockchain, através de cadeias de informação na Internet que não são controladas por nenhum governo ou agência de inteligência. Crime organizado, tráfico de droga, tráfico de seres humanos, roubos, banditismo, entre outros, "transbordo" de tudo isto para outras partes do mundo. Uma coisa fica no território dos países da União Europeia, outra vai mais longe. Aparentemente, eles têm a ilusão de que esse "trânsito de armas" não os afetará. Tiveram essa ilusão quando provocaram a Primavera Árabe, quando destruíram a Líbia, quando tentaram ocupar a Síria. Depois tiveram de "acordar" quando viram dezenas, centenas de milhares, milhões de migrantes com todos os seus problemas perto na sua terra. Tiveram então de passar do mundo ilusório para o mundo real. Falámos sobre isto a toda a hora. Em particular, nos nossos briefings de 12 de janeiro e 17 de fevereiro. Os fornecimentos descontrolados de armas à Ucrânia por parte dos países ocidentais está a provocar uma forte deterioração do quadro delituoso não só na Europa, mas também em todo o mundo. Isso começou muito antes da operação militar especial na Ucrânia, desde o golpe de Estado, de fevereiro de 2014 a dezembro de 2021. Este processo tem-se desenrolado, tendo acabado por aumentar em velocidade e dimensão. Antes da operação militar especial, as autoridades de Kiev tinham recebido cerca de 70,5 mil milhões de dólares em ajuda militar. Gostaria de sublinhar mais uma vez que isso tinha acontecido antes da operação militar especial. Ao mesmo tempo, o controlo sobre as armas recebidas permaneceu, como dizem os especialistas, extremamente fraco. De facto, não existia. Até nos EUA, na NATO os dirigentes da UE em Bruxelas perderam a paciência em relação a todos os esquemas corruptos que dominavam nos escalões superiores e nas estruturas filiadas. Foi exigida uma investigação. Foram publicados materiais, ao que se seguiram algumas demissões, processos criminais, ações penais, etc. Os esquemas de corrupção foram atingidos apenas superficialmente. Ninguém tocou nos esquemas de corrupção relacionados com as armas. Penso que se trata de uma única "rede". Consequentemente, isto levou à transformação da Ucrânia numa "zona cinzenta", de onde as armas letais "migraram" para outras regiões instáveis do mundo. Na época de operação militar especial da Federação da Rússia, os países ocidentais enviaram à Ucrânia uma ajuda militar sem precedentes: a quantidade de armas dos EUA e de outros países ocidentais entregues à Ucrânia é muitas vezes superior à que o Ocidente forneceu aos mujahidins durante os 10 anos de guerra no Afeganistão.

As decisões irresponsáveis do regime de Kiev sobre a distribuição maciça de armas de fogo entre a população e a entrada de produtos militares fornecidos ao regime de Kiev por países estrangeiros no mercado informal fizeram com que as armas acabassem nas mãos de criminosos e terroristas. Toda a gente se cala sobre isso. E para onde irão estes terroristas? Para as regiões mais pobres do mundo? Provavelmente também para lá. Mas, antes de mais, têm absolutamente outros objetivos e tarefas. A Internet está cheia de propostas de venda de armas e munições fornecidas à Ucrânia. As propostas são de ucranianos. A venda de armas é efetuada em criptomoedas, entre outras moedas, sendo os terroristas, extremistas e grupos criminosos destinatários de compras. Sem dúvida, tudo isto servirá como poderoso catalisador para a redistribuição das esferas de influência entre grupos criminosos e para as guerras mafiosas, nas quais participarão novas associações criminosas. No entanto, é errado pensar que todos estes problemas ficarão lá, dentro de uma “zona vedada" onde um cidadão de bem nunca entra, que tudo isso se passará ao lado. Eu diria que é um crime pensar assim e fazer a população crer nisso. Ao obter estas armas, os grupos criminosos, os terroristas, os extremistas, utilizam-nas não só uns contra os outros, mas também contra os civis, contra a sociedade, contra o Estado. Aparentemente, a revenda no mercado "negro" das armas fornecidas não incomoda muito o "Ocidente coletivo". O principal beneficiário da crise é, antes de mais, a indústria de guerra norte-americana, que procura, contra o bom senso, mais um ganho comercial.

A principal ameaça é que as atividades terroristas e criminosas possam assumir proporções sem precedentes. Sobretudo se, para além das armas de fogo, conseguirem deitar a mão a outras armas, como os sistemas de defesa antiaérea portáteis Stinger e os mísseis antitanque Javelin. Pode imaginar-se a dimensão e as consequências. Karl Marx escreveu: onde há lucro, qualquer moralidade deixa, em princípio, de existir. Aqui nem sequer estamos a falar de moralidade, mas de bom senso no contexto da segurança e do bem-estar de cada um. Aparentemente, quando uma pessoa acumular determinadas quantias, os seus recetores começam a atrofiar-se.

Pergunta: Como está a situação em torno do acordo de cereais?

Maria Zakharova: Os representantes das partes (Rússia, Turquia e Ucrânia) e da ONU mantêm contactos de trabalho no Centro de Coordenação Conjunto de Istambul. Isto é necessário para a realização de inspeções de acordo com os procedimentos acordados. Está a ser discutida a realização de uma reunião de alto nível no próximo período. Assim que a data e o formato forem acordados, iremos confirmá-los o mais rapidamente possível. As nossas avaliações da implementação da Iniciativa do Mar Negro em conjunto com a implementação do Memorando Rússia-Secretariado da ONU sobre o acesso dos produtos agrícolas e fertilizantes russos ao mercado mundial são bem conhecidas. Não mudaram. Respondemos diariamente a perguntas e partilhamos as nossas avaliações. Serguei Lavrov falou sobre este assunto em pormenor durante a sua recente visita a Nova Iorque, durante uma reunião com o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, e numa conferência de imprensa.

Posso dizer que a próxima ronda de consultas sobre a aplicação do memorando entre a delegação russa e os representantes da ONU, chefiada por Rebeca Grynspan, Secretária-Geral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, terá lugar em Moscovo a 5 de maio.

Pergunta: O combustível nuclear foi recentemente entregue à central nuclear de Akkuyu, na Turquia. A França apoia o projeto da central nuclear de Paks-2 que está a ser concretizado pela Rosatom na Hungria. Outros países europeus também dependem da Rússia em termos de tecnologia e de fornecimento de combustível nuclear. No entanto, a Alemanha insiste em que a UE inclua a energia nuclear civil russa no 11º pacote de sanções. Como é que o Ministério dos Negócios Estrangeiros avalia estas duas linhas contraditórias nas relações russo-europeias?

Maria Zakharova: Há muito ficou claro que a "guerra de sanções" contra o nosso país desencadeada pela UE se transformou num fiasco retumbante: as sanções não causam os danos à Rússia que o Ocidente esperava, mas atingem o próprio Ocidente. Coisas absurdas, estúpidas. Aparentemente, eles gostam disso. A escassez e o elevado custo dos recursos energéticos têm como consequência a desindustrialização e o aumento dos problemas socioeconómicos na Europa. Isto não é apenas uma observação nossa. Nós já previmos tudo. É uma análise feita por eles. Pode ler os artigos publicados pelos principais economistas ocidentais. Eles descrevem tudo em pormenor. Os funcionários da UE, guiados exclusivamente pelos interesses da "solidariedade" transatlântica, agindo de facto sob a pressão de Washington, não se dão ao trabalho de lidar com as necessidades reais dos Estados membros, estão prontos para tudo (refiro-me à burocracia de Bruxelas) para que a "roda das sanções" não pare, porque no ambiente de russofobia por eles cultivado, as restrições passaram há muito de instrumento de política externa a fator real da política interna da UE. Por isso, obcecados em pressionar a Rússia, eles estão dispostos a trilhar qualquer caminho suicida. É óbvio que estão dispostos a praticar o "banditismo económico". Viu e ouviu os debates sobre este assunto. Há uma série de exemplos concretos e de ações implementadas. Embora os representantes da direção da UE admitam que já usaram quase tudo do "arsenal" disponível, Bruxelas está constantemente a pensar no que mais poderão impor ao nosso país para que este sinta finalmente as dolorosas consequências. Na minha opinião, trata-se de uma divisão da consciência política de Bruxelas. Eles próprios estão a sofrer com as sanções impostas. Mesmo assim, não param de inventar novos esquemas para nos prejudicar ainda mais. Há uma expressão que diz: "Jogar pedras no próprio telhado”. A lógica de Bruxelas é uma pedra no seu telhado. Agora, os russófobos da UE estão a tentar alargar as sanções ao setor de energia atómica russo. Vou tentar apelar à voz da razão. Apesar de todas as divergências no seio da UE relativamente às atitudes para com a energia nuclear, esta continua a ser um elemento-chave da segurança energética para vários países da UE e para a UE em geral. É lamentável que alguns círculos da UE estejam a tentar politizar também esta área da cooperação energética com o nosso país, ao mesmo tempo que abrem o mercado aos exportadores norte-americanos de combustível e tecnologia nuclear.

É claro para nós que Bruxelas, tal como no caso do fornecimento de gás, só irá piorar a sua situação se tentar impor restrições no domínio de usos nucleares pacíficos. Além disso, neste caso, não só o fornecimento fiável de energia aos consumidores europeus, mas também a segurança nuclear de uma série de unidades geradoras de energia dos países da UE podem estar ameaçados.

Pergunta: A Rússia ratificou o protocolo sobre a cooperação entre os membros da OTSC no domínio da segurança biológica. Anteriormente, o Ministério da Defesa russo divulgou informações sobre a atividade dos biolaboratórios militares dos EUA no território pós-soviético. Que países vizinhos têm biolaboratórios controlados pelos EUA no seu território nacional e que medidas podem ser tomadas neste domínio?

Maria Zakharova: As questões de biossegurança ganharam proeminência na agenda internacional nos últimos anos. Graças aos esforços de Washington, evoluíram de uma questão da segurança biológica internacional para um problema da segurança biológica.

Tendo isto em mente, os Estados membros da OTSC decidiram consolidar esta questão como uma das áreas de cooperação. No seguimento do acordo acima referido, a 28 de abril passado, o Presidente da Federação da Rússia, Vladimir Putin, promulgou a Lei “Da ratificação do Quarto Protocolo sobre alterações à Carta da OTSC”. Além disso, no ano passado, fora criado, no âmbito do Comité de Secretários dos Conselhos de Segurança da OTSC, um Conselho de Coordenação dos organismos autorizados dos Estados membros da OTSC para supervisionar toda a gama de questões da biossegurança. A sua primeira reunião teve lugar a 15 de dezembro de 2022, em São Petersburgo. A próxima reunião está agendada para julho próximo em Minsk. A Rússia está interessada em desenvolver uma cooperação aprofundada neste domínio no âmbito da OTSC e está pronta a contribuir de todas as formas possíveis para o funcionamento eficaz da nova estrutura. A atenção prioritária dada às questões da biossegurança no âmbito da OTSC deve-se, entre outros fatores, à crescente evidência de atividades militares e biológicas extremamente perigosas e descontroladas dos EUA em várias regiões do mundo, incluindo o espaço pós-soviético. As atividades dos EUA levantam sérias questões em termos de cumprimento da Convenção sobre as Armas Biológicas e Toxínicas (CABT). O lançamento da operação militar especial pôs a descoberto um grande número de novos factos sobre a forma como o Pentágono e outros departamentos dos EUA na Ucrânia, país que não lhes é vizinha e que se encontra no outro extremo da Terra, se tornou um campo de ensaio para as suas experiências com substâncias perigosas. Tudo isto foi feito a coberto do Ministério da Saúde ucraniano. De facto, tratava-se de um programa do Pentágono. O próprio Ministério da Saúde ucraniano trabalhou, durante vários anos, não apenas sob os auspícios e supervisão, mas diretamente sob a direção de um homem enviado pelos EUA, com a cidadania, passaporte e curriculum vitae adequados.

Sob o pretexto de assistência sanitária e epidemiológica, o Pentágono lançou uma produção em série de laboratórios biológicos noutros países, entre os quais as ex-repúblicas soviéticas. Uma vez que Washington bloqueou, desde 2001, a elaboração de um protocolo juridicamente vinculativo à Convenção sobre Armas Biológicas e Toxínicas, não tem sido possível controlar a forma e o envolvimento destas instalações em programas de investigação militar fechados. Temos falado repetidamente em briefings e ao nível da liderança política sobre a necessidade de tornar estes trabalhos transparentes. Os Estados Unidos e os países onde têm os seus biolaboratórios afirmaram que podem mesmo aceitar "visitas guiadas" a estas instalações. No entanto, há uma diferença entre uma inspeção e uma visita guiada. Na realidade, as visitas só eram permitidas até à " área de recepção", até a um balcão de visitantes ou de registo de pessoal, onde a visita acabava.

Por isso, os resultados da investigação patrocinada pelos Estados Unidos poderiam ser utilizados para fins incompatíveis com os interesses da segurança regional e internacional. Um exemplo gritante de tais atividades perigosas é o descoberto facto da implementação alegadamente "pacífica" de programas biológicos militares pelo Pentágono, em violação da CABT, na Ucrânia. A análise das informações obtidas durante a operação militar especial leva a concluir que o desenvolvimento de componentes de armas biológicas foi efetuado nas imediações das fronteiras da Rússia e de outros países da CEI/OTSC. Estas avaliações são confirmadas pelo recém-publicado relatório da nossa comissão parlamentar de inquérito sobre as circunstâncias que rodearam a criação de laboratórios biológicos na Ucrânia por especialistas norte-americanos.

Gostaria de salientar que, inicialmente, aparentemente apanhados desprevenidos, os altos representantes dos EUA não negaram que o seu país estivesse envolvido nestas atividades. Depois, meses mais tarde, apercebendo-se de toda a dimensão do que estava prestes a cair sobre eles e de que teriam de sair da situação criada, eles começaram a negar tudo. No início, não encontraram palavras de justificação, admitiram que estavam, de facto, a praticar estas atividades.

Numerosas questões a Washington relativamente a esta atividade continuam sem respostas adequadas por parte daqueles que são obrigados a participar em atividades de controlo e ainda precisam de ser resolvidas. Continuaremos a trabalhar nos fóruns multilaterais especializados (principalmente no âmbito da CABT) para resolver a situação e resolver as nossas reclamações. A situação na Ucrânia recorda-nos a necessidade de reforçar urgentemente a CABT e de retomar os trabalhos sobre um protocolo juridicamente vinculativo à Convenção e um mecanismo de verificação eficaz. Estes trabalhos devem ser realizados num quadro estabelecido e ter um resultado claro. Um resultado compreensível não é um programa de visitas turísticas, não é algo que eles querem que se veja, mas sim inspeções e verificações. Tencionamos trabalhar de forma consistente com os países que partilham as mesmas ideias para defender esta posição no novo Grupo de Trabalho para o Reforço da Convenção, criado pela 9ª Conferência de Revisão da CABT com base na proposta russa. Continuaremos a dar seguimento às iniciativas russas destinadas a reforçar e institucionalizar a CABT.

Estamos em estreito contacto com os nossos parceiros da CEI/OTSC sobre todas as questões relacionadas com a biossegurança e mantemos consultas regulares sobre este assunto. Temos assinados memorandos de entendimento intergovernamentais bilaterais com a maioria deles. A sua aplicação contribui significativamente para o reforço da segurança dos nossos países e das relações de amizade e promove a cooperação neste domínio. Este é um domínio sensível e necessário a uma verdadeira cooperação prática. Não quero que os jornalistas, os peritos e os analistas políticos vejam isto como espécie de "conjunto de léxico internacional". Não se trata de "clichés", mas sim da nossa vida. O ano de 2020 trouxe-nos a pandemia da COVID-19 e mostrou-nos como pode ser a vida e quais os desafios que a humanidade pode enfrentar. Parece que somos capazes de fazer tanto, de saber tanto, e depois acontece que, num par de semanas, o mundo inteiro fica num estado de total paralisia de capacidades e, por vezes, de vontade porque não sabe como reagir. As consequências continuam a sentir-se. Quanto mais concreta for a atitude de todos os envolvidos neste assunto, quanto menos virmos nisto um malabarismo de termos, de papéis e teorias, melhor.

Pergunta: Na semana passada, o Presidente chinês, Xi Jinping, teve uma conversa telefónica com o Presidente ucraniano, Vladimir Zelensky. O Presidente chinês afirmou que a China iria enviar um representante especial para os assuntos euro-asiáticos à Ucrânia e a outros países, a fim de trocar opiniões sobre a resolução política da crise ucraniana. Como avalia o papel da China na resolução da crise ucraniana? E quais são as suas expetativas?

Maria Zakharova: Um comentário sobre uma questão semelhante já foi publicado no nosso sítio web. Posso repetir os pontos principais em poucas palavras. A nossa posição não se alterou. Registamos a disponibilidade da parte chinesa para envidar esforços no sentido de estabelecer um processo de negociação. Verificamos que as nossas posições de princípio são conformes com e as disposições do documento publicado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês a 24 de fevereiro. Ao mesmo tempo, consideramos que o problema não é a falta de bons planos. Embora isso seja sempre bem-vindo. Vou repetir mais uma vez o que já dissemos em numerosas ocasiões, incluindo hoje. Até agora, o regime de Kiev tem demonstrado rejeitar todas e quaisquer iniciativas sensatas que visem uma resolução política e diplomática da crise ucraniana, e tem condicionado o seu eventual acordo às negociações a ultimatos e exigências completamente irrealistas. É disto que se trata. O regime de Vladimir Zelensky e ele próprio proibiram-se de negociar com a Rússia. As autoridades ucranianas e os seus patrões ocidentais mostraram, já antes de 2022, a sua capacidade de afogar as iniciativas de paz em conversas ocas sem fim. Não foram tanto eles que o admitiram, mas aqueles que garantiram o cumprimento pelo regime de Kiev das suas obrigações ao abrigo dos acordos de Minsk. Recorde-se as revelações da ex-chanceler alemã, Angela Merkel, e do ex-Presidente francês. François Hollande. Não o fizeram acidentalmente. Não se trata de uma conversa de bastidores que se tornou pública devido à fuga de informação, nem de uma partida. Foram entrevistas, declarações feitas no âmbito de conversas à frente das câmaras com jornalistas, em que falaram sobre como os acordos de Minsk não funcionaram porque não iam ser implementados pelo "outro" lado e foram utilizados para fins completamente diferentes. Este é mais um exemplo de como não só as boas intenções, mas também um plano concreto baseado numa análise real da situação "no terreno", no conhecimento das especificidades do conflito e das especificidades da situação, foram objeto de um tratamento pejorativo por parte daqueles que eram obrigados a implementá-lo. Não porque tivessem assinado "alguns" acordos que, depois, foram considerados por eles irrelevantes, mas porque isso fazia parte de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU que todos eram obrigados a implementar. Os acordos de Minsk, como reconhecem os patrões ocidentais e os próprios funcionários de Kiev, tornaram-se um instrumento para ganhar tempo e acumular potencial ofensivo. Na primavera de 2022, os acordos de paz quase prontos repetiram o destino dos acordos de Minsk. Que me lembre, o regime de Kiev fez uma proposta. Nós respondemos e enviámos a Kiev os nossos materiais. No entanto, não recebemos nenhuma resposta em abril de 2022. Vladimir Zelensky chegou mesmo a proibir legalmente quaisquer negociações com o lado russo. Assim, qualquer apelo à paz dificilmente pode ser adequadamente percebido por quem não é um ator independente, mas um fantoche manipulado, neste caso, por Washington.

Mais de uma vez vi as contradições e falácias lógicas, para não dizer puros disparates, cometidas pelos patrões norte-americanos do regime de Kiev na questão da rejeição da ideologia comunista. Lembro-me bem de como a representante dos EUA se sentou à mesa redonda do Conselho de Segurança das Nações Unidas e falou sobre a necessidade de combater o comunismo em todo o mundo durante uma reunião aberta à imprensa. Isso quando à sua frente estava sentado o representante da China, país com assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas e onde o Partido Comunista da China está no poder. Mas o Partido Comunista não está apenas no poder na China. É o maior, o mais numeroso partido político do mundo. A representante norte-americana tentou dizer algo assim na cara do representante chinês, sem sequer se aperceber com quem estava a ter uma conversa ou um monólogo. O mesmo pode ser dito sobre Vladimir Zelensky. Este repete, com ou sem vontade, tudo o que diz o seu "Grande Irmão". Está à frente de um país que proibiu oficialmente a ideologia e o partido comunistas. Está também a "liderar" (como lhe chamam) o processo de "descomunização" na Ucrânia. Recentemente, o presidente da Comissão para os Negócios Estrangeiros do parlamento ucraniano, Oleksandr Merejko, declarou que a pertença de Taiwan à China reconhecida pela comunidade mundial é uma "ilusão comunista". Isso é normal? A hipocrisia crassa e, possivelmente, uma falta de conhecimentos elementares é um traço marcante da "democracia" ucraniana importada do Ocidente.

Pergunta: O Ministro das Finanças da Rússia, Anton Siluanov, declarou que os países BRICS poderiam ter uma moeda veículo. Qual é a probabilidade de esta surgir num futuro próximo?

Maria Zakharova: Dada a atual situação internacional, em que as moedas ocidentais (o dólar, o euro) são utilizadas pelo "Ocidente coletivo", pelos países da NATO e pelas suas alianças político-militares como instrumento de pressão e, em alguns casos, como arma direta, cada vez mais países pensam em aumentar o papel dos sistemas de pagamento e das moedas alternativas nas liquidações mútuas. Os BRICS estão a agir em conformidade com estas tendências. Não se trata de um desejo de magoar alguém ou de provar alguma coisa. É a situação que impõe estas decisões. Os países rejeitam pressões e não querem ser novamente logrados pelo Ocidente. Há muitos anos que Washington diz que o dólar não é apenas a moeda nacional dos Estados Unidos, mas um fator, um projeto, um elemento do espaço económico interno, que os Estados Unidos estão dispostos a fornecer a todos para o bem da cooperação financeira económica internacional, para a atividade económica das entidades internacionais. Isto foi apresentado precisamente desta forma. Além disso, foi Washington que falou da impossibilidade de utilizar métodos políticos de pressão para a solução de problemas e questões económicas, da impossibilidade de utilizar a conjuntura política por que isso perturbava o curso natural das relações económicas, como a concorrência, a liberdade de empreendimento, os mecanismos de mercado, etc. As coisas acabaram por ser diferentes. Verificou-se que, desde o início, Washington tinha um plano diferente: utilizá-lo em momentos críticos (e talvez em momentos que não seriam críticos, mas importantes para os seus interesses) como elemento de chantagem, de pressão, por vezes como arma para implementar os sues objetivos sujos e ilegais. A ideia de criar uma moeda de reserva internacional baseada no cabaz de moedas dos BRICS, que poderia ser utilizada nos desembolsos entre os integrantes da associação, foi avançada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, na Cimeira dos BRICS de 23 de junho de 2022. Esta iniciativa é virada para o futuro. Exige uma análise pormenorizada a cinco. A criação de instrumentos de pagamento supranacionais não é um processo fácil. Em todo o caso, as questões relativas aos mecanismos de pagamento estão no centro das atenções dos BRICS. Não excluímos que este tema possa ser abordado durante a próxima reunião dos líderes dos cinco países na África do Sul.


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