Principais pontos do briefing proferido pela porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Maria Zakharova, Moscovo, 9 de março de 2023
Ponto da situação na crise ucraniana
No passado dia 5 de março, a Ucrânia assinalou o aniversário da morte do colaborador nazi Roman Shukhevich. Por esta ocasião, um grupo de nacionalistas realizou, na aldeia de Belogorscha, perto de Lviv, onde Shukhevich tinha sido aniquilado pelos serviços secretos soviéticos, uma cerimónia de homenagem sob as bandeiras do Exército Insurreto Ucraniano (UPA), cantou cânticos rituais e até celebrou um culto de oração.
Assim, os atuais seguidores ucranianos das organizações nazis demonstraram mais uma vez o seu desejo de continuar o trabalho dos seus "heróis", cujas mãos estão banhadas de sangue de milhares de ucranianos, russos, judeus, polacos e representantes de outras etnias. Aparentemente, concordam plenamente com as práticas punitivas usadas por Roman Shukhevich, que apelou ao extermínio em massa de pessoas e declarou cinicamente: "Não devemos ter medo de que as pessoas nos amaldiçoem pela nossa crueldade. Não haverá nada de terrível em que dos 40 milhões da população ucraniana só reste a metade". Aparentemente, é este "preceito" canibalista que hoje guia o regime de Vladimir Zelensky, que continua a sacrificar a vida de dezenas de milhares de ucranianos aos seus interesses egoístas.
Como soubemos, alguns familiares de prisioneiros de guerra russos têm recebido chamadas de pessoas desconhecidas na Ucrânia, exigindo que realizem atos subversivos e terroristas em território russo. Se se recusarem, ameaçam matar os nossos militares mantidos em cativeiro ucraniano. Como é que isto pode ser qualificado? Como crime, é óbvio. Condenamos firmemente estas práticas criminosas do governo ucraniano. Exortamos as organizações internacionais especializadas não só a prestarem atenção a este facto, mas também a darem-lhe uma avaliação de princípio. Ouvimos dizer que estas organizações estão a recolher informações sobre crimes de que querem acusar a Rússia. Agora estamos a partilhar factos que as estruturas especializadas internacionais podem incluir nas suas listas, uma vez que agora estão a elaborar um registo.
Registamos as tentativas de invasão rastejante da Ucrânia pela Polónia. Isto está a acontecer em várias direções. Segundo os meios de comunicação ucranianos, a empresa polaca Lubawa, especializada na produção de hangares, vai construir um centro de treino militar na região de Volyn, com a capacidade para treinar 600 militares ucranianos. O local será entregue à embaixada polaca na Ucrânia, com todas as consequências legais daí decorrentes. Tudo isto está a ser feito com o conhecimento do regime de Kiev.
Obviamente, na realidade, trata-se da intenção de Varsóvia de implantar a sua infraestrutura para aumentar o contingente de tropas polaco, anteriormente anunciado como "Legião de Voluntários Polacos", que ficará instalado no referido centro. Quando e se ouvirem que Vladimir Zelensky "mantém tudo sob controlo", "ele não é contra" e que tudo isso está a ser feito "com a sua aprovação", devem ter em mente que ele não representa há muito tempo os interesses da Ucrânia, ele age exatamente na direção oposta. O que é benéfico, útil e necessário para esse país foi lançado no forno das suas ambições perversas ou instruções do Ocidente. Algo semelhante acontece neste caso. Na realidade, a Legião está a ser criada para controlar as atividades das autoridades locais e proteger a lei e a ordem nas regiões oeste da Ucrânia. O facto de isto poder envolver diretamente a Polónia no conflito ucraniano não é motivo de preocupação para ninguém em Varsóvia, e muito menos em Kiev. Recorde-se que as instalações militares na Ucrânia são um alvo legítimo das nossas Forças Armadas. A Polónia, porém, não desiste e continua a lutar para alcançar os seus objetivos. Pela internet circulam vídeos de "aliados" polacos do regime de Kiev a levarem em camiões para a Polônia terra preta. Não lhes faz lembrar nada? Só que, durante a Segunda Guerra Mundial e a Grande Guerra Patriótica, a Polónia esteve do outro lado da história, e a terra preta foi levada da Ucrânia pelos nazis. Não sei como isso acontece, mas podemos ver que os acontecimentos desses anos se estão a repetir, ressurgindo os símbolos, literatura, gestos nazis rituais e as práticas de pilhagem. É impossível acreditar nisso. Estou convencida de que, há um ano, teriam dito que se tratava de "propaganda russa" e que isso nunca poderia acontecer. Mas acontece. O objetivo é o mesmo: obter o maior lucro possível com o conflito. Isto é também o que Vl Vladimir Zelensky e os seus supervisores ocidentais estão a tentar alcançar, utilizando a população ucraniana como "bucha de canhão" e pondo a Ucrânia à venda em saldos. Todavia, já não é da venda que se trata (neste caso, prevê-se uma compensação) mas do saque e da pilhagem.
O desejo dos países ocidentais de obter o maior lucro possível com o conflito ucraniano é claramente ilustrado pelos números. Esta semana, o Primeiro-Ministro ucraniano, Denis Shmygal, admitiu que o seu país recebe a maior parte da ajuda ocidental sob a forma de empréstimos. No ano passado, a sua dívida pública aumentou em 13 mil milhões de dólares, atingindo 111 mil milhões de dólares. É abominável. Sempre foi dito aos ucranianos que o Ocidente os estava a ajudar, defendendo a sua condição de Estado, que a sua ajuda era desinteressada, simbolizando uma "manifestação de amor e atenção" para com o seu futuro, a democracia na Ucrânia, liberdade. Que liberdade é esta? É uma verdadeira escravização de onde não há saída.
Os 111 mil milhões de dólares é uma dívida insuportável mesmo para um país muito desenvolvido, com uma economia próspera, indústria desenvolvida e elevadas taxas de crescimento. No caso da Ucrânia, esta dívida permite aos credores apoderar-se de tudo o que restar após o governo de Vladimir Zelensky. Este ano, a Ucrânia tem de reembolsar empréstimos no valor de 18 mil milhões de dólares. O que acham que vai acontecer? A resposta é óbvia. O único queijo grátis está na ratoeira. Devemos dar crédito ao bom trabalho do Ocidente: preparou cuidadosamente a "ratoeira". Ficou linda, como um papel de parede fotográfico em que aparece o mar, o sol e as montanhas. Muitos cidadãos da Ucrânia, liderados por Vladimir Zelensky, correram para lá e viram que é um muro de betão armado. Serão os cidadãos ucranianos que terão de pagar pelas políticas do Ocidente e das atuais autoridades ucranianas.
Os anglo-saxões continuam a exigir que a Ucrânia intensifique a sua ofensiva para que o regime de Kiev possa reivindicar armas ocidentais (também a crédito), apesar das enormes baixas sofridas no campo de batalha. Neste contexto, prestámos atenção a uma das recentes conferências de imprensa de Vladimir Zelensky em que este afirmou que os EUA teriam de enviar "os seus filhos e filhas" para a zona do conflito. Estas palavras, acabadas de ser vazadas, causaram uma forte indignação na sociedade norte-americana. O que ele dissera anteriormente foi cuidadosamente preparado para a elite e o público norte-americanos para ser apresentado da melhor maneira possível e não causar irritação devido à sua lógica selvagem. Vemos quais os "filtros" que são utilizados pelos mass media norte-americanos para informar a audiência norte-americana. Nenhuma palavra pode chegar a um norte-americano sem passar por uma censura ferrenha interna nos meios de comunicação social norte-americanos. O que significam as palavras de Vladimir Zelensky? O regime de Kiev passou da mendicidade à chantagem direta, pondo em jogo vidas humanas. É interessante o que ele disse sobre a zona de conflito. Foi apresentado competentemente do ponto de vista da lógica do regime de Kiev. Vladimir Zelensky não especificou onde se situava a "zona de conflito" nem onde, na sua opinião, os "filhos e filhas" dos norte-americanos iriam morrer. Vou explicar porquê: é uma lógica terrorista. Os militantes, terroristas e extremistas travam combates onde acham conveniente e onde podem tirar os maiores dividendos sangrentos possíveis, e não onde os combates são travados entre forças armadas. Esta é a lógica terrorista.
Grupos de influência pró-ucranianos no Ocidente estão a tentar por todos os meios manter o interesse pelos acontecimentos na Ucrânia. Neste contexto, um artigo publicado pelo periódico britânico "The Guardian", que afirma que as empresas de lobby dos EUA ganharam milhões com royalties da indústria de guerra local por promoverem os seus interesses na administração norte-americana é ilustrativo. O negócio de armas norte-americano também espera conseguir a sua "fatia do bolo" no conflito ucraniano.
Além disso, os ocidentais, sob o pretexto de realizarem missões humanitárias, continuam a enviar os seus mercenários para a Ucrânia, os quais, juntamente com as unidades armadas ucranianas, não só participam em hostilidades, como também são constantemente apanhados a cometer atrocidades contra civis. Note-se que, em muitos países que fornecem "soldados da sorte", o mercenarismo é um crime. Quem se importa com isso? Há muito dinheiro em jogo, o ganho terá dimensão geopolítica. Aparentemente, quando se trata da exploração militar do território ucraniano, pode-se fazer vista grossa às violações das suas próprias normas legais. A melhor maneira de o fazer é tapar os olhos com notas bancárias. É ilustrativo que, no meio das declarações convincentes da direção política e militar ucraniana sobre a inevitabilidade de um fim vitorioso da guerra já em 2023, os patrões ocidentais de Vladimir Zelensky têm uma opinião diferente. Recentemente, o Subsecretário de Defesa dos EUA, Colin Kahl, admitiu que o conflito na Ucrânia poderia prolongar-se por mais dois ou três anos.
Todos estes factos mostram de quem depende realmente a continuação das hostilidades na Ucrânia e quem é o verdadeiro patrão. Não há nenhuma contradição quando dizemos que o regime de Kiev passou à chantagem direta. Dentro dos EUA e de outros países da NATO existe um grande número de forças políticas, de pessoas, de civis que não apoiam os seus governos nesta aventura. Para eles, estes factos são óbvios. Podem ver que ações de protesto estão a ter lugar em toda a Europa, o quão cuidadosamente especialistas com um ponto de vista diferente estão a ser eliminados do espaço de informação. Os seus artigos não aparecem nas páginas das publicações e são bloqueados na Internet. Isto mostra que o círculo daqueles que vêem a perniciosidade da aventura ocidental na Ucrânia está a alargar-se. Não há contradição no facto de Vladimir Zelensky estar a ser pressionado por determinadas forças. O seu objetivo é, entre outros, chantagear, através de Vladimir Zelensky, os seus próprios cidadãos para dar continuidade à tragédia.
Os representantes do regime de Kiev continuam a fazer declarações selvagens e retórica agressiva. No outro dia, o Presidente do Conselho de Segurança e Defesa Nacional ucraniano, Aleksei Danilov, disse, em entrevista à cadeia de televisão ucraniana "Canal 24", que a Ucrânia estava a considerar "reconquistar" a Crimeia militarmente. Admitiu também que Kiev começara a preparar-se para a guerra com a Rússia ainda em dezembro de 2019. Recorde-se que, naquela altura, houve a cimeira do "Quarteto da Normandia" em Paris e todas as declarações, promessas e garantias a favor da implementação dos acordos de Minsk e de uma solução política para a crise na Ucrânia. Agora soubemos que os preparativos militares tinham começado antes da cimeira. Acontece que aqueles no Ocidente que eram responsáveis pela implementação dos acordos de Minsk estavam bem cientes do caminho que tomariam. Este caminho previa não só o não cumprimento dos acordos, mas também um conflito armado. As autoridades ucranianas confirmaram mais uma vez que haviam desorientado fraudulentamente a comunidade internacional e que não tiveram nenhuma intenção de cumprir as suas obrigações ao abrigo do Pacote de Medidas de Minsk aprovado pela Resolução 2202 do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Pela internet circula uma foto de um "lembrete" do "defensor" da Ucrânia, elaborado pela igreja cismática. Contém, entre outras coisas, apelos à luta contra o mundo russo e afirma que "matar russos não é um pecado". Tais apelos dos cismáticos ucranianos protegidos pelo regime de Kiev e dos seus supervisores ocidentais, provam mais uma vez que eles são um projeto político que nada tem a ver com religião e que não professa valores cristãos, mas sim atitudes misantrópicas nazis. A história conhece muitos exemplos do gênero, entre os quais o colaboracionismo de representantes de uma das religiões mundiais com os nazis de Hitler durante a Segunda Guerra Mundial. Todos o viram. É possível ver e ler os respetivos documentos. Por isso, neste caso, não podemos dizer que é uma espécie de vida religiosa, espiritual. Não. É uma parte de um plano e de um projeto político de transformação da Ucrânia numa "anti-Rússia".
Como a direção da Federação da Rússia tem dito repetidamente, apesar de todos os esforços do "Ocidente coletivo" para prejudicar o nosso país a todo o custo, ninguém vai abandonar o rumo traçado. Trata-se de coisas de importância vital.
Sobre a duplicidade de critérios do Ocidente em relação à Ucrânia e ao Kosovo
Ouvimos muitas acusações de não estarmos a respeitar o direito internacional, estarmos do lado errado da história, enquanto que o Ocidente está do lado certo.
A hipocrisia e a duplicidade de critérios é, há muito, um ex-líbris da diplomacia ocidental. Lembramo-nos bem de como, em 2008, foi proclamada unilateralmente a "independência" do Kosovo. Naquela altura, os EUA e a UE defenderam unanimemente que a criação da "República do Kosovo" sem o consentimento de Belgrado não era contrária ao direito internacional. Recorde-se que ninguém consultou a Sérvia. Belgrado expôs claramente a sua posição, dizendo que era contra e que não podia apoiar este passo. Não houve nenhuns referendos (nem mesmo aqueles realizados pró-forma). O Ocidente apresentou argumentos duvidosos. Agora, passados 15 anos, os países ocidentais recusam-se a seguir as suas próprias "normas" no caso da Ucrânia. Rejeitam os resultados dos referendos realizados na Crimeia e Sebastopol, nas Repúblicas Populares de Donetsk e de Lugansk, nas Regiões de Zaporojie e de Kherson sobre a sua adesão à Rússia, qualificando-os de "ilegais". Em 2008, não houve nenhum referendo de separação do Kosovo. Os países ocidentais: os EUA e a UE (a Grã-Bretanha fazia então parte da UE) disseram que isso era normal e que era assim que se fazia. Então, o que mudou desde então? Porque, naquela altura, era normal fazer coisas como esta sem referendo e agora é anormal fazer coisas semelhantes através de referendos?
Recorde-se que, uma vez que isto faz parte da especulação nos meios de comunicação social, os autoproclamados "deputados" de Pristina declararam arbitrariamente o dia 17 de fevereiro de 2008 como Dia de Independência da província, ao arrepio da Resolução 1244 do Conselho de Segurança da ONU, documento jurídico internacional básico sobre a solução do Kosovo. Tudo isso gira em torno da questão da expressão da vontade popular, do direito internacional, da legalidade, etc.
Hoje em dia, o Ocidente está novamente a utilizar o seu método preferido. O diálogo entre Belgrado e Pristina sob os auspícios da UE tem todas as hipóteses de repetir o destino do formato Normandia. Exorto todos os peritos, cientistas políticos, jornalistas e a opinião pública a refletirem sobre o papel que os acordos com o Ocidente irão desempenhar. Afinal de contas, aí também há assinaturas de "importância mundial". Foram colocadas pelas pessoas que não só representavam certas forças políticas, mas também tinham poderes absolutos para verificar documentos do gênero. Estou a referir-me aos países ocidentais. Gostaria de dizer que os acordos de Minsk foram legalizados no Conselho de Segurança da ONU. O que é que o Ocidente fez com tudo isto? Nem se deu o trabalho de denunciá-los. Não quis sequer falar sobre a hipótese de rever ou alterar os acordos de Minsk. Simplesmente disseram, certo dia, que não tinham tido a menor intenção de cumpri-los. Não foi uma boa lição dada pelos países da NATO a todos, à Servia, em primeiro lugar?
Os acordos de 2013 e de 2015, que traçaram uma trajetória para um avanço rumo a um compromisso, também contaram com as garantias europeias. Lembram-se, os anos de 2013, 2014 ou 2015? Tudo se desenrolou de acordo com os mesmos roteiros, com os representantes das diplomacias da UE a posarem perante as câmaras, com os Presidentes de alguns países da NATO a darem a sua aprovação, sob os aplausos. Todos os vídeos em que todos eles aparecem fazendo promessas existem. Podem vê-los hoje. Foi tudo destruído num só dia. O problema é que, quando eles assinaram todas estas coisas, já então não tinham nenhuma intenção de as cumprir. Por exemplo, a assinatura do Alto Representante da UE para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança consagra, há dez anos, o compromisso de criar uma Comunidade de Municípios Sérvios no Kosovo. Esta instituição visa assegurar a sobrevivência da população sérvia na província. Contudo, as autoridades kosovares estão a tentar por todos os meios sabotar a sua criação, com a conivência de Bruxelas e de Washington. Os referidos documentos continuam em vigor e contem esta assinatura. Anos mais tarde, os EUA e a UE decidiram impor a Belgrado um plano de solução revisto em que os mecanismos de proteção dos interesses da população sérvia do Kosovo não são de todo mencionados.
Costumávamos perguntar aos nossos "não parceiros" (como se verificou agora) estrangeiros quando é que eles foram sinceros? Quando assinaram o documento? Ou depois, quando deram assinado por não assinado? Não faz sentido perguntar-lhes sobre isto agora, porque já há muito tempo que eles têm a resposta: nem quando assinaram nem depois de assinarem estes documentos. Isto só evidencia uma coisa: enquanto eles assumirem esta posição, não podemos confiar neles. É claro que este tipo de "evolução" não inspira confiança, porque esteriliza a própria ideia que é vital para os sérvios e Belgrado. Disse sobre a confiança nos "pacificadores" ocidentais no início do meu comentário.
Sobre as novas sanções da UE por violações dos direitos da mulher
Pela primeira vez, a UE acordou uma lista de sanções por violações dos direitos da mulher. Os cidadãos do nosso país, que não faz parte da UE, foram aí incluídos. Esta é uma referência à questão das novas sanções. Foram-nos enviadas muitas perguntas pelos meios de comunicação social. Resumindo todos estes pedidos, posso dizer que esta é realmente a primeira vez que isto acontece. Não é a primeira vez que vemos uma tal abordagem ocidental, particularmente por parte da União Europeia. Desta vez, foi inventada uma nova razão.
Ao impor mais uma restrição unilateral que mina as prerrogativas legais internacionais do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a União Europeia demonstra mais uma vez que segue uma política de padrão duplo, ignorando o princípio da presunção de inocência e não apresentando nenhumas provas de culpa. Ao mesmo tempo, os delitos óbvios cometidos pelos militantes ucranianos nas regiões do Donbass, Zaporojie e de Kherson da Federação da Rússia são hipocritamente silenciados. As decisões são frequentemente tomadas na UE com base em informações fornecidas diretamente pelo regime de Kiev. Todos sabemos muito bem como ele sabe falsificar e distorcer os factos. Por isso, veredictos ilegais como este, tal como toda a política em matéria de direitos humanos da UE não valem nada. É de notar que os funcionários da UE decidiram celebrar o Dia Internacional da Mulher, impondo sanções aos homens em vez de darem um apoio real às mulheres. A propósito, elas estão muito mais bem protegidas na Rússia do que nos países membros da UE. Posso citar um exemplo que provavelmente não é do conhecimento de muitas pessoas na UE. Na Rússia, as mulheres podem gozar de licença de maternidade remunerada de três anos. A UE faria melhor em concentrar-se no estudo da nossa experiência positiva em matéria de direitos da mulher e não naquilo que elas estão a fazer, ou seja, na destruição do direito internacional, no menosprezo pelas normas legais e na elaboração de listas de paragem ou restrições de toda a espécie. Têm trabalho a fazer para se aproximarem dos nossos padrões. As suas decisões são de natureza antijurídica.
Sobre a iniciativa de Consenso Nacional promovida pelo governo provisório haitiano
Gostaria de chamar a atenção para a evolução da situação política interna no Haiti. Consideramos a assinatura do Acordo de Consenso Nacional, a 21 de dezembro de 2022, e a formação do Alto Conselho de Transição como passo limitado na direção certa que, se devidamente tratado pelo governo haitiano e pela comunidade internacional, poderia ajudar a normalizar a situação no país.
É de preocupar o facto de uma parte significativa das forças políticas locais se ter recusado a chegar a um acordo. Entretanto, em vez de procurar um terreno comum com a oposição, o governo está efetivamente a desalojar os discordantes do processo político sob o pretexto de sanções unilaterais impostas pelos países ocidentais.
Dado o episódio pouco decoroso da interferência externa nos assuntos internos deste país, sob a forma de intervenção direta ou de engenharia política, a atual ronda de medidas restritivas unilaterais impostas por vários países sem consultar o Comité de Sanções 2653 e uma possível operação militar no país que está a ser elaborada pelos EUA e os seus aliados, destinam-se não tanto a estabilizar a situação no Haiti, mas sim a limpar o cenário político no interesse de alguns líderes indulgenciados e investidos de poderes pelos seus patrões ocidentais.
A Rússia não está a dar preferência a nenhum dos partidos nem está a fomentar o conflito entre o atual governo e a oposição. Na nossa opinião, é evidente que, sem um consenso verdadeiramente inclusivo sobre a saída da crise, não será possível alcançar a paz e a estabilidade, retificar a situação socioeconómica nem recolocar o país no caminho de desenvolvimento institucional.
A rejeição de um diálogo construtivo e inclusivo a favor de confrontos sob pretextos plausíveis é mais uma manifestação criminosa da política de padrão duplo que acarreta o risco de um novo ciclo de violência e sofrimento para os cidadãos locais.
Sobre a estratégia de segurança cibernética dos EUA
Prestámos atenção à estratégia nacional de cibersegurança divulgada pela Casa Branca na semana passada. É um documento odioso. Contém todo um conjunto de acusações gratuitas, bem conhecidas, contra a Rússia. Não fomos os únicos a ser atingidos. Vários outros países foram também acusados de utilizar tecnologias de informação e comunicação alegadamente para interferir nos assuntos internos de Estados "democráticos". Claro que estes Estados "democráticos" não interferem com ninguém. Não há nenhum exemplo de interferência dos EUA, dos países da NATO nos assuntos de outros Estados, não é? Apenas a Rússia e alguns outros países "antidemocráticos", como são chamados em todos os documentos de política externa dos EUA, fazem isso.
Comentámos muitas vezes estas invetivas (não apenas no caso de cibersegurança como também em outras ocasiões). Antes de acusar um país de atividades maliciosas no espaço de informação, é preciso apresentar provas concretas. Quando é que, nos últimos anos, os EUA se preocuparam em apresentar provas, factos? Uma vez enviaram Colin Powell ao Conselho de Segurança das Nações Unidas para exibir um frasquinho de vidro, apresentaram um verdadeiro espetáculo ao dizer que tinham "algumas provas". Ninguém nos EUA se preocupou sequer em pedir desculpa à comunidade internacional (para não dizer ao Iraque) pela sua falsificação. Aparentemente, depois disso, decidiram abandonar todas e quaisquer tentativas de se preocupar com a recolha de provas como algo completamente desnecessário e ineficaz. Acho que, para não ficar em situações embaraçosas de novo. Ou seja, não há provas em princípio. Isto diz igualmente respeito ao referido relatório.
São necessárias provas concretas quando se fazem acusações de práticas ilegais no ciberespaço. Tudo isto apesar de termos sugerido repetidamente aos EUA utilizar os canais de comunicação bilaterais criados para o efeito para tirar todas as dúvidas, preocupações e trocar informações sobre possíveis ameaças. Os canais bilaterais foram criados para resolver estes problemas rapidamente. Mas porquê utilizá-los quando se pode subir ao microfone sem apresentar nenhuma prova, lançar acusações e anunciar as conclusões feitas?
O que é mais notável é que, aprovando a nova estratégia cibernética, os EUA estão a tentar usurpar o direito de elaborar regras de comportamento responsável em matéria de segurança da informação internacional no quadro das Nações Unidas. Além disso, declaram a sua intenção de punir os países que, na opinião de Washington, violam estas regras. Parece que a Casa Branca reivindica o papel de "árbitro" e de "gendarme" no ambiente digital, consagrando-o no respetivo documento.
Neste contexto, gostaria de lembrar aos nossos "não parceiros" que a discussão nas Nações Unidas sobre as regras de comportamento responsável não foi proposta pelos EUA, foi proposta pela Federação da Rússia. Foi por nossa iniciativa que foram lançados formatos-chave de negociação na ONU, incluindo o Grupo de Trabalho Aberto para a Segurança da Informação Internacional, tendo sido adotadas as respetivas resoluções da Assembleia Geral. É de salientar que nunca se tratou de um país, e muito menos dos EUA, exercer as funções policiais no espaço de informação. Em suma, gostaria de aconselhar Washington a temperar as suas ambições, inclusive nesta área, e a cruzar o que escreve para o seu uso interno, para os seus próprios cidadãos, com os factos. Afinal de contas, eles existem.
Fiquei impressionada com os raciocínios habituais dos autores da estratégia sobre a problemática dos direitos humanos, à luz dos esforços da administração Biden para prolongar a vigência da secção 702 da Lei "Da Vigilância da Inteligência Estrangeira". Gostaria de deixar claro: assim se chama o diploma tristemente celebre que confere aos serviços secretos dos EUA poderes praticamente ilimitados na área da vigilância eletrónica em todo o mundo, inclusive o território dos EUA, ou seja, contra os seus próprios cidadãos.
É ilustrativo que os funcionários da Casa Branca tenham declarado sem rodeios que Washington precisa desta lei, não tanto para combater o terrorismo, como para combater os adversários geopolíticos. Afirma-se que a recolha de informações sobre a Rússia, Coreia do Norte, Irão e China deve impedir ataques informáticos às infraestruturas dos EUA e dos seus aliados.
Recorde-se que temos um canal de comunicação bilateral com os EUA sobre casos que levantam questões no ambiente cibernético. E os EUA não o utilizam. No entanto, precisam de uma lei de vigilância para prevenir problemas no ambiente cibernético. É ilógico, estúpido e imprevidente. De facto, as autoridades dos EUA continuam (e não se sentem nada embaraçadas) a prática viciosa da vigilância total e da interceção de dados de utilizadores comuns de dispositivos eletrónicos. Edward Snowden contou detalhadamente sobre isso. Trata-se, de facto, de uma violação grosseira dos direitos humanos fundamentais. Neste contexto, as declarações moralistas de Washington e os seus slogans sobre a liberdade da Internet parecem ainda mais hipócritas.
Sobre o aniversário do bombardeamento de Tóquio
Num dos nossos briefings recentes, falámos da estratégia anglo-saxónica de longa data de destruir o inimigo com um tapete de bombas. Comentámos a destruição total de Dresden e do ataque a Praga em 1945. Hoje em dia, gostaríamos de recordar o ataque aéreo mais demolidor da Segunda Guerra Mundial.
Há 78 anos, na noite de 9 para 10 de março de 1945, 325 bombardeiros pesados B-29 dos EUA levantaram voo das bases aéreas nas Ilhas Marianas com destino a Tóquio.
Como se refere na secção do nosso site intitulada "Documentos Históricos", a Força Aérea dos EUA lançou 1665 toneladas de bombas e napalm sobre a capital japonesa, matando 83 mil habitantes e ferindo outros 41 mil. De acordo com outros relatórios, o número de mortos ultrapassou os 100.000. Como resultado, 16,5 milhas quadradas da cidade, ou mais de 40 por cento das habitações, foram queimadas, deixando 180.000 famílias sem casa. A necessidade do bombardeamento de Tóquio do ponto de vista militar é avaliada de forma ambígua. Foi um ato de terror e de retaliação. O uso de napalm levou à destruição da cidade predominantemente de madeira e ao surgimento de um "tornado de fogo".
O correspondente soviético N. Bogdanov, que veio ao Japão a 31 de agosto de 1945, para cobrir a rendição do Japão, escreveu o seguinte: "O que é Tóquio depois da guerra? Acontece que percorremos vários quilómetros sem nos apercebermos de estarmos a ir pela cidade. Havia asfalto debaixo das rodas, carris enferrujados de elétrico - nenhum outro sinal de uma rua da cidade. À direita e à esquerda havia um deserto castanho salpicado de cinzas. De repente, no meio do deserto surgiu uma ampla praça pavimentada, com um polícia no centro a regular o tráfego. Havia uma praça, havia um tráfego, o que não havia eram prédios, nenhum vestígio dos mesmos, como se estivéssemos a atravessar o fundo de uma cidade invisível arrastada por uma inundação fantástica... Em Tóquio, não restavam mais de quinze por cento das casas. Subsistem apenas edifícios de tipo europeu que abrigavam ministérios, embaixadas, bancos... Os norte-americanos lançaram bombas incendiárias de modo a criar anéis de fogo. Para onde quer que os japoneses corressem, depararam-se com um muro de fogo. Os habitantes da cidade atiraram-se para a água para fugir ao fogo. A cidade tinha muitos canais e lagos caseiros. No entanto, o calor era tão forte que a água nas pequenas lagoas fervia e nas grandes lagoas as pessoas morriam sufocadas. Assim, os norte-americanos recordaram aos japoneses os seus bombardeamentos bárbaros de cidades chinesas indefesas".
As atrocidades dos militares japoneses na China, noutros países asiáticos, e os seus crimes biológicos contra o nosso país, entre outros, são bem conhecidos. Não há dúvida de que, naquela altura, o regime japonês verteu rios (para não dizer mares) de sangue. Mas não é disso que estamos a falar. Estes crimes devem ser punidos de acordo com a lei. Naquela altura, não havia pessoas mais assustadoras do que aquelas que estavam no banco dos réus em Nuremberga. Esses homens, vistos como epítome do mal absoluto no planeta Terra, foram julgados de acordo com a lei. Esses monstros eram tratados da forma prevista pela lei em relação aos prisioneiros. O que descrevi, citando um jornalista soviético que viu Tóquio depois dos bombardeamentos norte-americanos, afetou sobretudo a população civil. Terão os bombardeamentos norte-americanos sido conformes com o direito internacional? As pessoas e forças que estiveram envolvidas nos crimes deveriam ser condenadas. Isto aconteceu mais tarde nos julgamentos de Tóquio e Khabarovsk, onde estiveram presentes os verdadeiros responsáveis da liderança japonesa. Mas foram os civis que haviam sofrido represálias antes disso. Não é um sacrilégio?
O jornalista soviético ficou surpreendido ao notar que "as fábricas de aviões Mitsui e as fábricas de armas Mitsubishi localizadas nos bairros periféricos da cidade não foram atingidas pelo bombardeamento.
Das 206 cidades japonesas, 98 foram bombardeadas. Como resultado, 2.210 mil casas, cerca de um quarto de todas as casas japonesas, foram destruídas e queimadas. As baixas civis causadas pelos bombardeamentos aéreos e de artilharia, segundo diferentes estimativas, foram de 500.000 a 900.000 pessoas. Contudo, como os factos históricos atestam, os bombardeamentos de saturação desumanos e as aventuras atómicas norte-americanas em Hiroshima e Nagasaki não fizeram o governo japonês render-se. O Japão decidiu de parar de resistir só quando o Exército Vermelho entrou na guerra.
O bombardeamento de Tóquio, de Dresden e de outras cidades está de acordo com as tradições históricas norte-americanas de conduzir guerras. A matança em massa de civis num país inimigo é considerada aceitável se tiver um efeito militar rápido e intimida o inimigo. Eles chamam a isso "custos". Eles têm um termo especial para isso. Do mesmo modo, os alemães não consideraram qualquer atrocidade, na realidade genocídio, da população soviética como crime de guerra.
E quanto ao Japão, Tóquio oficial, infelizmente, ainda não percebeu nem reconheceu plenamente a sua culpa de desencadear a Segunda Guerra Mundial, que, como sabemos, na realidade não começou no dia 1 de setembro de 1939, mas no dia 7 de julho de 1937, com a agressão japonesa na Manchúria. E tal como no caso de Hiroshima e Nagasaki, a atual direção japonesa não se atreve a "irritar" o seu aliado norte-americano com as recordações do bombardeamento de Tóquio em março de 1945. A declaração oficial do Gabinete de Ministros de 7 de maio de 2013, afirma timidamente que, embora o bombardeamento não cumprisse o princípio da humanidade, não foi contrária ao direito internacional da época. É normal?! O que é que vocês querem? O Japão está também ocupado pelos EUA. As tropas norte-americanas e as suas bases estão lá. Das manipulações norte-americanas dentro da elite política japonesa nem falo. Serão necessários outros comentários? Penso que não.
Sobre o "cancelamento" da cultura russa
Apesar das contínuas "intrigas" contra a nossa cultura e os seus destacados representantes em alguns países ocidentais, entre as quais o cancelamento de exposições e concertos, a declaração arbitrária de artistas e poetas russos mundialmente famosos como sendo de origem ucraniana, o mundo continua ansioso para conhecer a cultura russa na sua dimensão moderna e histórica.
Os aniversários de Fiodor Chaliapin, Serguei Rachmaninov, Aleksandr Ostrovski anunciados este ano pelo Ministério da Cultura russo e incluídos no calendário das datas comemorativas da UNESCO, bem como o 125º aniversário do Teatro de Arte de Moscovo e o 250º aniversário da Academia Estatal de Coreografia de Moscovo não passam despercebidos no estrangeiro.
O 150º aniversário do nascimento de Fiodor Chaliapin, "génio da terra russa", é amplamente celebrado não só no nosso país, mas também no estrangeiro, onde se realizam eventos com a assistência do Ministério da Cultura russo, do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, e das missões diplomáticas russas.
Uma série de eventos comemorativos do aniversário natalício de Fiodor Chaliapin foi realizada a 16 de fevereiro passado na Itália. Entre eles um concerto de artistas dos Teatros Bolshoi e Mariinsky e uma mesa redonda sobre "A vida e o espólio artístico de Fiodor Chaliapin na Rússia e na Itália". A exposição do Museu Nacional Russo de Música "Bravo, Chaliapin", em Roma, foi extremamente interessante, tendo sido organizada com o apoio do Teatro de Ópera de Roma e do Teatro alla Scala de Milão que não só proporcionaram à exposição as mais raras fotografias e publicações de arquivo dedicadas às atuações de Fiodor Chaliapin na Itália como também destacaram a contribuição imperecível do cantor russo para a ópera italiana e europeia e para o património musical mundial.
Resumo da sessão de perguntas e respostas:
Pergunta: Parabéns pelo Dia da Mulher passado!
Maria Zakharova: Obrigada! Aceito os seus parabéns. Mas gostaria de os transmitir a todo o pessoal feminino do Ministério dos Negócios Estrangeiros e das nossas missões diplomáticas no estrangeiro.
Li um artigo publicado pela 'Spiegel' cheio de mentiras descaradas e senti-me envergonhada deste periódico. Não penso que seja necessário sentir qualquer emoção especial em relação aos meios de comunicação alemães. No caso de muitos deles, tudo é claro, mas ainda assim deve haver um limite. O artigo descreve o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia como a organização mais sexista onde as mulheres não podem ocupar cargos dirigentes. Não sei quais os dados que foram usados pelos autores da obra. Praticamente metade, 47%, do pessoal do Ministério são mulheres. Se tivermos em conta apenas o pessoal diplomático, cerca de 35% do pessoal são mulheres. Vale dizer que, até meados dos anos 80, as instituições de ensino especializadas quase não admitiam raparigas. Quarenta anos mais tarde, 35% do nosso pessoal são mulheres.
Se os ocidentais pensam que vamos fixar quotas para as mulheres, que não se preocupem, não o faremos. Avaliamos os funcionários pelas suas competências profissionais.
Ontem, o jornal "Komsomolskaia Pravda" publicou um artigo baseado num discurso direto do pessoal feminino do Ministério, pessoal superior (cônsules-gerais, vice-diretores de departamentos, diretores de departamento). Respondendo às perguntas dos jornalistas, as mulheres diplomatas enfatizaram principalmente o profissionalismo como principal critério para a progressão na carreira. Nenhuma palavra foi dita sobre a questão do género, quotas e outras novas tendências. Não há dúvida de que nós, mulheres que trabalham no Ministério, temos direito à nossa opinião e que realmente pensamos assim.
Esta não é uma história imposta, não é uma tendência inventada. É algo que sentimos na realidade, tendo trabalhado no nosso Ministério durante muitos anos. Nenhumas quotas, nenhuma superioridade de género fará de um não profissional um profissional e não pode ajudar a conquistar o respeito de outros funcionários. Apenas trabalho, profissionalismo e constante aperfeiçoamento de si próprio.
Pergunta: A 27 de fevereiro passado, Belgrado não assinou o plano franco-alemão para o Kosovo. Quantas vezes é que a Sérvia terá de dizer "não" ao Ocidente, e terá o Ocidente limites para deixar a questão da integridade territorial sérvia em paz no final?
Maria Zakharova: Esta pergunta deve ser dirigida ao lado sérvio e às suas estruturas oficiais. Muito se tem dito hoje sobre a etimologia da crise e todas as atrocidades que o Ocidente cometeu contra a Sérvia na questão do Kosovo. Usando manobras sujas em torno da questão do Kosovo, os EUA e a UE estão a tentar lavar a vergonha da agressão da NATO contra a Jugoslávia em 1999 e dos crimes de guerra então cometidos, pelos quais ninguém foi responsabilizado. Estão a tentar fazê-lo forçando a Sérvia a aceitar a famigerada "condição de Estado" do Kosovo. O Ocidente passou dos limites e dos limites morais, nem neste contexto nem noutros.
Defendemos inabalavelmente uma resolução pacífica do problema do Kosovo com base no direito internacional e na resolução 1244 do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Continuaremos a ajudar os nossos parceiros sérvios a defender os seus legítimos interesses, a sua soberania e a sua integridade territorial na questão do Kosovo.
Quanto à sua pergunta sobre quantas vezes a Sérvia deve dizer "não". A questão não é saber quantas vezes, mas se existe a vontade de defender a sua soberania e interesses nacionais e de trabalhar para o futuro do seu país.
Pergunta: Em que medida está a Rússia disposta a ajudar a Sérvia e a Republika Srpska a resistir à pressão ocidental no que se refere à adesão às sanções e à histeria antirrussas?
Maria Zakharova: Já o dissemos em parte. Estamos conscientes da pressão sem precedentes exercida pelos centros de decisão ocidentais sobre os nossos parceiros nos Balcãs (isto diz respeito não só à Sérvia) para os forçar a ir contra os interesses dos seus povos. Isto acontece não só no caso da Rússia, não é apenas uma tentativa de fazer com que estes países se coloquem contra o nosso país. É também uma tentativa de os forçar a ir contra os seus povos (porque os seus interesses nacionais estão a ser violados), contra a consciência e a verdade histórica, a juntarem-se à bacanal russofóbica, a reescrever os livros de história escolares, a permitir que os vândalos voltem a demolir monumentos, a contar histórias de que não foram a Rússia, a União Soviética, o nosso povo soviético, o Exército Vermelho que libertaram os outros povos durante a Segunda Guerra Mundial (para nós durante a Grande Guerra Patriótica) e que o nosso papel naquela guerra foi completamente diferente. Por enquanto, alguns países, entre os quais a Sérvia, continuam a resistir. Vemos que até agora têm força e paciência suficientes (o que é importante) para resistir.
Temos vindo a construir as nossas relações com a Sérvia numa base secular de amizade, afinidade espiritual dos povos dos dois países e vantagem económica mútua. Ninguém se recusa a fazê-lo. Na minha opinião, é evidente. Muitos, por alguma razão, acreditam que se trata de cooperação puramente ideológica ou de proximidade politicamente motivada. Nada disso. A nossa cooperação surgiu historicamente e é agora economicamente vantajosa para a Sérvia.
Trabalhamos de forma honesta e aberta. Os sérvios sabem que podem sempre contar com o nosso apoio. Continuamos a implementar projetos conjuntos de grande escala nos setores económico, energético, de infraestruturas, e de alta tecnologia. Estamos convencidos de que isto é do interesse nacional da Rússia e da Sérvia. Não fazemos promessas inviáveis, nem avançamos ideias míticas ou concedemos enormes empréstimos nas condições o mais favoráveis possível, e assim por diante. Concretizámos um grande número de projetos de grande escala que continuam a servir os interesses da Sérvia.
Elogiamos a decisão da República de Srpska de desenvolver uma cooperação mutuamente benéfica com a Rússia. Não temos dúvidas de que as boas tradições nos permitirão vencer, também desta vez, os desafios comuns. Da nossa parte, temos participado na implementação de todas as iniciativas e acordos existentes para melhorar a parceria bilateral. Estamos convencidos de que uma forte amizade é a garantia de uma interação em pé de igualdade que não pode ser perturbada por nenhumas ameaças externas. A cooperação com os nossos parceiros sérvios não é dirigida contra países terceiros e contribui para o reforço da segurança e o desenvolvimento.
Pergunta: A empresa estatal de energia da Polônia, a Orlen, anunciou a sua intenção de processar Moscovo por cortar o fornecimento de petróleo à Polónia através do oleoduto "Drujba". Ao mesmo tempo, ouvimos alguns políticos europeus dizerem que a Europa conseguiu livrar-se dos hidrocarbonetos russos. Haverá alguma lógica nas ações dos europeus, e como Moscovo consegue conciliar posições tão contraditórias da Europa trabalhando com as contrapartes europeias?
Maria Zakharova: Este é um caso a ser tratado pela medicina. Teve toda a razão em confrontar as duas afirmações, as duas citações. Estas não são apenas frases separadas, retiradas do contexto. Trata-se de uma ideologia muito bem anunciada que, porém, não foi elaborada pela Polónia. Foi imposta à Polónia pelos seus patrões ocidentais que tentaram dominar de ano para ano, de século para século. Resume-se à tese de que os recursos do nosso país não devem ser controlados por nós, mas por aqueles que, como eles acreditam, têm direito de controlá-los em virtude do seu "excecionalismo". Houve muitas tentativas de nos desapossar dos nossos recursos mediante a invasão, destruição da população, gestão interna, etc. No entanto, houve também tentativas de estabelecer relações normais. Vendemos os nossos recursos em condições mutuamente benéficas, demonstrando, durante décadas, as nossas capacidades como fornecedores iguais. No entanto, esta situação não era do seu interesse. Porquê? Em primeiro lugar, porque ganhávamos dinheiro, em segundo lugar, desejávamos cooperar em pé de igualdade, em terceiro lugar, esta cooperação mostrava que os recursos russos podiam ser usados em pé de vantagem mútua como mercadoria, pois o seu objetivo foi sempre apoderar-se dos nossos recursos e dividi-los entre um grupo eleito de países. Por outras palavras, o nosso país deveria dar tudo o que era necessário ao desenvolvimento, segurança, bem-estar económico dos regimes ocidentais. Em contrapartida, deveríamos receber, em vez de dinheiro e garantias, a desestabilização ao longo das nossas fronteiras e escalada de conflitos. Este é um novo conceito que o Ocidente está agora a promover em diversas vertentes.
A UE tomou uma decisão puramente política e não autónoma de se livrar dos hidrocarbonetos russos, em detrimento das suas necessidades. Eles precisavam de algo completamente diferente, o que lhes dávamos: recursos, pagando por isso um preço absolutamente proporcional e mutuamente benéfico. Nós estávamos a fornecer um produto de qualidade, altamente competitivo. Não era um comércio primitivo de recursos, era algo que contribuía para o impetuoso desenvolvimento da ciência, tecnologia, economia, finanças, áreas que compunham a moldura da nossa cooperação em matéria de energia. Já não menciono o desenvolvimento da educação, estágios, intercâmbios mútuos de cientistas, etc. Tudo isto faz certamente parte deste cenário global de cooperação energética entre a Rússia e o continente europeu.
Quando começou a falar-se da necessidade de desistir dos hidrocarbonetos russos, ficou claro que os EUA estavam por detrás disso. Eles não faziam segredo disso. Pelo contrário, sublinhavam que acreditavam que uma agenda energética comum não era necessária para o continente europeu e que a Europa não deveria constituir um sistema energético único. Para os EUA, só os recursos norte-americanos tinham o direito exclusivo de dominar a região. Isso quando os EUA não faziam parte do continente europeu. Ninguém era contra a participação competitiva dos EUA no mercado da energia da UE ou da Europa. Poderiam ter oferecido um preço mais interessante, poderiam ter negociado para interessar aos clientes europeus. Não fizeram nada disso. Como sempre, acharam preferível resolver as questões à bastonada.
A União Europeia resistiu o quanto pôde. Como resultado, foi perpetrado um ataque terrorista, e ninguém sabe quem foi o seu autor. Podem ler todas estas teorias absurdas que são postas em circulação.
A UE está a passar por graves problemas económicos, entre os quais o aumento da inflação, a queda do PIB, a ameaça de desindustrialização. As coisas não estão a correr como Bruxelas esperava. Agora Varsóvia, ainda recentemente entusiasmada com as "declarações vitoriosas" e achincalhadoras sobre o fim da dependência dos recursos energéticos russos, começa a exigir a continuação dos fornecimentos de petróleo russo através do oleoduto "Drujba".
Pergunta: Numa conferência de imprensa em Baku, o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, afirmou que o estabelecimento de um posto de controlo na estrada de Lachin não está previsto na Declaração Trilateral, "mas há uma possibilidade de tirar, por meios técnicos, as suspeitas que existem quanto à sua utilização para os devidos fins". Na semana passada, houve um conflito armado entre soldados azerbaijaneses e arménios, no meio de suspeitas semelhantes. A que meios técnicos é que o chefe da diplomacia russa se referiu e existem planos de os pôr em ação num futuro próximo? E, em geral, que assistência tenciona Moscovo prestar para evitar tais incidentes?
Maria Zakharova: Não tenho nada a acrescentar ao que o Ministro Lavrov disse. Posso dizer que estão a ser mantidos contatos com as partes, com a participação do comando da Força de Paz russa e em coordenação com o nosso Ministério. As partes continuam a procurar soluções para a situação em torno do corredor de Lachin e Nagorno-Karabakh. Não vale a pena entrar em detalhes publicamente devido ao caráter delicado desta questão.
Pergunta: A Reuters noticia, citando uma fonte de alto nível das autoridades ucranianas, que Kiev iniciou negociações com os seus parceiros para prolongar o acordo de cereais, e que a Rússia não está a participar nas mesmas. Esta informação corresponde à verdade? Qual é a posição de Moscovo sobre o prolongamento do acordo de cereais neste momento?
Maria Zakharova: Não posso dizer quais os contatos em que estamos ou não envolvidos, porque são muitos. Posso dizer que outra ronda de consultas deve realizar-se a 13 de março em Genebra e envolver uma delegação russa e altos funcionários da ONU: o Subsecretário-Geral da ONU para a Ajuda Humanitária, Martin Griffiths, e a Secretária-Geral da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), Rebeca Grynspan. O acordo que mencionou será aí discutido.
Pergunta: O Diretor Executivo do Programa Alimentar Mundial da ONU (PAM), David Beasley, disse que o acordo de cereais deve ser renovado "a todo o custo". Se não for prorrogado, o mundo estará à beira da desestabilização e da fome em massa, disse ele. Como avalia as perspetivas de prorrogação do "acordo de cereais", tendo em conta que o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia afirmou que os compromissos de desbloquear as exportações russas de cereais e fertilizantes ao abrigo do acordo não foram cumpridos?
Maria Zakharova: Esta não é uma previsão meteorológica, que não depende daqueles que a fazem. É um processo de negociação que envolve delegações. Afirmámos repetidamente que se trata de um "acordo de pacote". O Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, já o disse muitas vezes. Não fomos nós que o propusemos. Este formato do acordo foi proposto pelo Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres. O acordo de pacote prevê dois conjuntos de compromissos, devendo ambos ser cumpridos.
Estamos a fazer os possíveis para garantir o cumprimento dos dois conjuntos de compromissos. Neste caso, o prognóstico é otimista. Se o segundo conjunto de compromissos permanecer por cumprir por uma infinidade de tempo, então o prognóstico é pessimista. Não disse nada de novo, repetindo apenas o que tem sido repetidamente explicado pelo lado russo a todos: aos participantes no acordo, aos funcionários da ONU, e ao Secretário-Geral da ONU, tanto em público como nos bastidores, tanto em detalhe como em resumo.
Pergunta: Os congressistas norte-americanos Jason Crowe e Adam Smith disseram à Reuters a 6 de março que a Ucrânia solicitou aos EUA que fornecessem munições de fragmentação a fim de as utilizar em drones para atacar as tropas russas. Moscovo tem algum comentário? E como podemos avaliar a perspetiva de fornecimento destas munições?
Maria Zakharova: Comentar o quê, a iniciativa do regime de Kiev ou dos senadores norte-americanos?
Pergunta: A iniciativa foi da Ucrânia. Como pode avaliar a perspetiva de fornecimento de tais munições?
Maria Zakharova: Não posso nem devo comentar a qualidade da sua pergunta. Tem o direito de fazer qualquer pergunta. Não posso deixar de notar que ao falar sobre se podemos comentar esta iniciativa, isso requer confirmação da parte autora da iniciativa. Kiev, o regime de Kiev e os seus representantes devem responder se isso é ou não a verdade, a quem eles pediram, etc.
Vimos recentemente uma declaração feita por altos representantes do regime de Kiev de que não pretendem utilizar as armas fornecidas para atacar o território da Federação da Rússia. Compreendemos perfeitamente que não podemos confiar no regime de Kiev. Todos já tiveram a oportunidade de se convencer disso. Neste momento, não há provas que sustentem isto. Todavia, acho que o senhor tem a possibilidade de fazer esta pergunta aos representantes ucranianos. Se a sua informação for confirmada, teremos de reagir de modo conforme. Não é difícil prever o que a nossa resposta será. Temos afirmado repetidamente que qualquer fornecimento de armas ao regime de Kiev é o nosso alvo legítimo.
Quanto ao fornecimento de armas para atacar o território russo, isto também já foi comentado muitas vezes. Estes fornecimentos tornam estes países comparsas em tudo o que está a acontecer, colocando-os à beira de um confronto com o nosso país.
Se tiver a oportunidade de obter uma declaração ou uma reação de representantes oficiais do regime de Kiev, teremos todo o prazer em comentá-la.
Pergunta: As explosões nos gasodutos Nord Stream não serão investigadas pelo Centro Internacional de Haia, disse o representante da Comissão Europeia, Christian Wiegand, num briefing em Bruxelas. Ele disse que o incidente estava fora do âmbito das atividades desta estrutura. O Ocidente oferece à Rússia outras plataformas para uma investigação conjunta do incidente e das questões expostas nas publicações do jornalista norte-americano Seymour Hersh? Além disso, poderia comentar a notícia sobre a implicação de um grupo pró-Ucraniano nos atentados bombistas?
Maria Zakharova: A sua pergunta exige um milhão de respostas. Vamos por parte. Podemos ver (falámos sobre isto hoje) a completa impotência da União Europeia e dos países do continente europeu que sofreram com este ataque terrorista. Os prejuízos foram causados à economia, às finanças, às infraestruturas, à segurança e ao meio ambiente. Muitas coisas foram prejudicadas, não só a segurança energética. Muitos aspetos foram atingidos por este ato de terrorismo. Os países diretamente envolvidos, em cujas águas territoriais isso aconteceu, os países vizinhos, os destinatários dos recursos energéticos, os participantes no consórcio (Nord Stream 1, Nord Stream 2) não têm o direito, dado que estão inseridos num modelo baseado na NATO, de falar, fazer suposições ou responder às perguntas que surgem depois da publicação dos materiais do jornalista norte-americano Seymour Hersh mencionado pelo senhor. Os europeus não nos convidam a participar na investigação, apresentando desculpas de toda a espécie. Chegaram ao ponto de nos dizer que não podem comentar nada até a investigação terminar. Por outro lado, nunca hesitaram em correr para o microfone para comentar e acusar-nos daquilo que eles próprios fizeram. Refiro-me ao caso Salisbury, Amesbury e outros semelhantes relacionados com os envenenamentos pelo agente químico "Novichok". Agora dizem que não têm o direito de comentar. Apresentam cada vez mais desculpas para não se interessarem pelo destino dos seus próprios países, economia, finanças, segurança energética. Estas coisas estão interligadas neste momento. Se nos lembrarmos da primeira reação da direção da Comissão Europeia, eles descreveram este incidente como sabotagem, receando usar o termo "ataque terrorista". Ao mesmo tempo, como se deve recordar, se um camião embate contra uma multidão num dos países europeus, o incidente é imediatamente apresentado como ato de terrorismo, mesmo que não haja vítimas humanas. Recorde-se que as explosões ocorreram nos gasodutos. O ataque fora cuidadosamente planeado e executado com rigor profissional. É óbvio que serviços especiais estiveram envolvidos porque é lógico que os pescadores de pérolas não o tenham podido fazer. É evidente que esta operação foi realizada com a utilização de equipamento de guerra especial. De repente, verifica-se que ninguém tem autoridade para comentar. Até o termo "ataque terrorista" foi evitado pelos representantes oficiais, preferiram descrever o incidente como sabotagem.
Nos primeiros tempos, como talvez se recordem, as declarações da Comissão Europeia foram mais audazes. Disseram que estavam determinados a proteger as infraestruturas críticas da UE. Depois começaram a fazer suposições no sentido de pode ter sido a Rússia a cometer este atentado. Claro que este ato foi cometido pela Rússia, não poderia ter havido outras teorias. Depois calaram-se. Aparentemente, obtiveram alguns factos depois de ter examinado o local do crime. Depois vieram os jornalistas que iniciaram a sua própria investigação. E tudo parou por aqui. O mais provável é que o seu " Grande Irmão", supervisor de tudo o que acontece sob o "guarda-chuva" da NATO, tenha proibido a realização de quaisquer investigações alternativas e tenha colocado tudo sob o seu controlo. A julgar pelas ações subsequentes de Bruxelas, eles estão prontos a proteger a sua segurança, todas as suas infraestruturas energéticas, menos aquela em que a Federação da Rússia está envolvida, pelo que estou a ver, a sua determinação diminuiu muito.
No Ocidente, as investigações dos jornalistas que fornecem factos são totalmente ignoradas. O jornalista investigativo Seymour Hersh, ganhador do Prémio Pulitzer de Reportagem Internacional, apresentou uma investigação e dados concretos que precisam de ser comentados. Em vez disso, sobreveio o silêncio. É uma situação estranha. Pode este ser um processo ativo? Neste caso, sim. Som, luzes, emissões são desligadas desde que a investigação não se torne do domínio público e se mantenha fora do campo de informação. Como é que isso é conseguido? Através do controlo total dos meios de comunicação social. Qual é a reação da União Europeia? A apatia total em relação ao tema. Aparentemente, para evitar incomodar Washington, ignoram completamente qualquer conversa sobre uma investigação. Quão pouco característico deles.
Todavia, os moldes da gestão da informação são parecidos. As reações da UE e da NATO aos acontecimentos que as afetam são estranhas. E, se se lembrar, no caso de Salisbury, Amesbury, do envenenamento pelo "Novichok", não houve provas. Não se sabia se isso teve ou não lugar, o que aconteceu com os Skripals, onde estavam, em que condição estavam... Não houve declarações diretas. Foi mostrado um vídeo, que obviamente não fora gravado por jornalistas, em que a filha de Serguei Skripal leu um texto pré-elaborado, só isso. Não houve nenhuns contactos com eles. Ninguém sabe o que acontecera. Algo semelhante ocorreu no caso de "envenenamento" de Aleksei Navalny. Nenhumas informações, nenhuns factos foram apresentados.
Neste caso, os factos estão à vista. Há um corpus delicti, vestígios das explosões, dados, vídeos. Há uma enorme quantidade de equipamento que registou tudo isto: o que aconteceu, o que estava na região algum tempo antes disso. Existem todos os materiais. Eles devem ser estudados e divulgados. O que temos, porém, é o silêncio total.
Lembre-se de como os patos mortos comoveram tanto o então Presidente dos EUA, Donald Trump (foram-lhe mostrados pela sua filha), que ele decidiu expulsar os diplomatas russos. Como pretexto, foi usado caso dos patos mortos. Patos? No caso do Nord Stream, os gasodutos foram dinamitados no fundo do Mar Báltico. Isto resultou em enormes emissões de substâncias para a atmosfera. O incidente foi considerado pelos cientistas como verdadeira catástrofe ecológica que, porém, não causou nenhuma emoção no Ocidente. Talvez porque os patos poderiam ter dito alguma coisa e os peixes se mantêm calados. É difícil imaginar, mas isso parece uma anedota que todos nós estamos a viver neste momento.
Os pedidos de uma investigação independente e abrangente, com a participação da Rússia enviados pelo lado russo aos governos da Alemanha, Suécia e Dinamarca foram ignorados. O Ocidente evita completamente qualquer contato com a Rússia sobre este tópico. A questão de escolher locais alternativos para realizar uma investigação conjunta nunca foi sequer levantada.
Somos certamente a favor de uma investigação exaustiva com base nas normas legais. Repito, não se trata de uma ameaça mitológica, de uma história inventada ou de um ato duvidoso que possa ou não ter sido cometido, mas de um ato de terrorismo, com todos sinais de um desastre ambiental, energético, etc. em grande escala que afetou a vida de um grande número de pessoas, países e ecossistemas, cometido com a utilização de equipamento especial não disponível publicamente e é de uso exclusivo dos serviços secretos.
Pergunta: Na abertura da 52ª sessão do Conselho dos Direitos Humanos em Genebra, a 27 de fevereiro passado, o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, afirmou: "Chegou a hora de se colocarem do lado certo da história, de defenderem os direitos de todos em todos os lugares. Face às dificuldades do dia de hoje e do dia de amanhã, devemos voltar à Declaração Universal e garantir a sua plena implementação". De que "lado "certo" pensa que ele falou?
Maria Zakharova: Li o discurso do Secretário-Geral da ONU no segmento de alto nível da 52ª sessão do Conselho dos Direitos Humanos da ONU que decorre nestes dias em Genebra. O Secretário-Geral salientou, com razão, que este ano a comunidade internacional celebra o 75º aniversário da adoção da Declaração Universal dos Direitos do Homem, o principal instrumento internacional de direitos humanos, no qual os Estados declararam a sua determinação em "afirmar a fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e valor da pessoa humana, na igualdade de homens e mulheres e na igualdade de direitos das nações grandes e pequenas". Ao mesmo tempo, António Guterres disse que as disposições e ideais da Declaração estão agora a ser ameaçados de todos os lados, e uma dessas ameaças, segundo o Secretário-Geral da ONU, é a operação militar especial russa. Esta é uma abordagem superficial e, mais importante, irresponsável, enquanto o regime de Kiev ignora completamente as violações dos direitos e liberdades da população de língua russa e a agressão contra os habitantes do Donbass. Recorde-se do desrespeito pela componente legal desta questão, a desconsideração dos resultados dos referendos e assim por diante.
Na nossa opinião, um regresso à implementação por todos os governos dos instrumentos básicos dos direitos humanos, incluindo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o respeito pelo direito internacional, o abandono das práticas de pressão e chantagem, e a garantia da igualdade de todos os Estados, podem repor a paz e a prosperidade no nosso planeta. Pelo menos não como um objetivo absoluto, mas como objetivos declarados e a possibilidade de os realizar. É nessa altura que provavelmente focaremos todos do "lado certo da história". Se qualificarmos o "lado certo" e o "lado errado" da história, temos de nos lembrar de que a história não é um dia, uma semana ou um ano. É um processo, um estado em que nos encontramos. Então seria bom abordarmos outros desafios aos direitos humanos e analisarmos quem e quando esteve deste ou daquele lado da história na história recente. Porque somos os únicos a ter recebido uma honra tão duvidosa? Porque é que o Secretário-Geral da ONU se cala sobre os "excecionais"? E que dizer dos EUA e da Grã-Bretanha e das suas aventuras no Iraque? E o que dizer da sua interferência nos assuntos internos de dezenas de países em todo o mundo? E o que dizer da Primavera árabe que foi provocada externamente e teve consequências desastrosas para a região? E o que dizer dos acontecimentos na Líbia, na Síria? Teria sido bom se ele se tivesse lembrado da Jugoslávia, dado que as consequências dessa tragédia ainda hoje se fazem sentir.
Aconselhamos o Secretário-Geral da ONU a não só se lembrar da história como também a estudá-la melhor. Se o tivesse feito, muitos dos acontecimentos atualmente em curso na Ucrânia, bem como o que os precedeu, tornar-se-iam claros para ele. Então não teríamos ouvido argumentos no sentido de "não há e não pode haver manifestações de nazismo e neonazismo na Ucrânia". Porque "não há nem pode haver"? Alguém comprou uma indulgência? Compreendo que está no estilo da ideologia ocidental comprar o direito à superioridade moral. Está no seu sangue, na sua cultura. Se estamos a falar da Declaração Universal dos Direitos do Homem, ela faz a humanidade avançar numa direção diferente. Não se pode comprar o direito à superioridade moral. Só pode ser conquistado através de atos práticos e preceitos ideológicos e filosóficos levados à prática.
Pergunta: Durante o discurso do Ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, Hossein Abdollahian, na 52ª sessão da ONU dezenas de pessoas saíram da sala. Poderia comentar este comportamento dos diplomatas ocidentais? Na sua opinião, é uma falta de capacidades diplomáticas ou uma tentativa de agradar aos seus patrões de Washington?
Maria Zakharova: É uma provocação. Este comportamento dos diplomatas ocidentais mata certamente a diplomacia como profissão e é de lamentar. A atual diplomacia no Ocidente está num estado deplorável. Tudo isto é mais uma prova da sua incapacidade de aceitar outros pontos de vista. Como sabem, isto já politizou e conferiu um grau de confronto à discussão das questões atuais da promoção e proteção dos direitos humanos. Os países do "Ocidente coletivo" não conseguem, há muito, ouvir opiniões diferentes expressas por Estados soberanos usando sanções coercivas unilaterais e outras sanções para exercer pressão e punir os governos legítimos por seguirem políticas independentes. Não obstante, o nosso país continua a apelar ao diálogo e considera inaceitável impor normas neoliberais e não levar em consideração a diversidade de culturas, tradições e especificidades dos caminhos de desenvolvimento civilizacional, histórico e socioeconómico.
Em relação ao Irão. Durante muitos anos, são os Estados ocidentais que têm interferido nos assuntos internos deste país soberano e democrático. Por alguma razão, o Ocidente usurpou o direito de afixar rótulos "democrático" ou "não democrático" noutros países. Eles simplesmente não conhecem a história do Irão. É um Estado democrático com liberdade de opinião, pluralismo, tradições e a sua própria cultura. Isto precisa de ser respeitado tal como está consagrado no direito internacional.
Pode ser que a razão por que os diplomatas ocidentais saíram da sala foi a de que tiveram vergonha de olhar o alto representante iraniano nos olhos. Afinal de contas, os ocidentais sabiam a verdade sobre o que estavam a fazer a este país.
Pergunta: O Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Turk, falou sobre a "agressão militar", citando como exemplo a invasão russa da Ucrânia. Porque é que a ONU faz vista grossa a todas as violações dos direitos humanos cometidas pelo regime de Kiev? Onde estiveram todas estas pessoas que condenam agora a Rússia durante os oito anos em que o regime ucraniano matou civis no Donbass?
Maria Zakharova: Porque só estão a expressar um ponto de vista que lhes foi imposto. Acabaram de falar sobre o assunto. Infelizmente, não estamos surpreendidos, mas indignados com tais declarações. E o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e o seu pessoal estão constantemente a abusar do seu mandato. O próprio Comissário e outros representantes das estruturas dos direitos humanos da ONU deveriam observar o seu mandato, protegê-lo e implementá-lo de acordo com todas as regras e cânones. Vemos que eles não podem, ou melhor, não querem, ir além da perceção ocidental do que está a acontecer no mundo. Quem e porquê? A questão está em aberto - pressão, chantagem, ameaças ou o desejo de ser leal. Estão a transmitir as atitudes dominantes neste ambiente, no qual não há procura por uma cobertura objetiva da situação dos direitos humanos na Ucrânia e dos crimes cometidos pelas autoridades pós-Maidan. Mais uma vez, esta posição desacredita o próprio Volker Turk e a sua visão.
Pergunta: Uma nova onda de ataques terroristas do regime de Kiev: uma incursão atroz à região de Briansk, o recente atentado (felizmente malsucedido) contra a vida de Konstantin Malofeev. Até que ponto, do ponto de vista do nosso país, estas ações são independentes? Ou foram patrocinadas, como antes, pelo Ocidente?
Maria Zakharova: Tudo está como o senhor diz. Estas ações não só foram patrocinadas como também instigadas pelo Ocidente. Embora feita tacitamente, a interferência do Ocidente salta à vista até porque o Ocidente não reage negativamente às invetivas extremistas e terroristas do regime de Kiev, nem exige a sua punição, a realização de uma investigação, etc.
Sobre a autonomia. Se, durante décadas, criar pessoas com uma lógica extremista, colocar no poder na Ucrânia não tanto políticos como sabotadores políticos que professam a ideologia extremista (a comprová-lo estão os casos da Casa dos Sindicatos de Odessa, dos protestos de Maidan, disparos contra os seus cidadãos, queima dos pneus, destruição das infraestruturas civis, das linhas elétricas na Crimeia), estas pessoas acabam por levar uma vida autónoma. A força motora foi lançada desde o início. Acrescente a isso orientações vindas do estrangeiro. Como resultado, os ocidentais criaram um "monstro". Não imagina quantos monstros foram criados pelo Ocidente liderado pelos EUA! Sabe isso muito bem. Ben Laden, que foi a encarnação das suas ideias, elogiado pela imprensa ocidental, financiado e ajudado em armas e apoiado politicamente pelo Ocidente, tornou-se, um dia, inimigo da democracia que deveria ser destruído. Criaram outro "monstro". O seu destino e o de toda a provocação são evidentes.
Pergunta: O Ocidente continua a exercer pressão sobre o desporto russo. Entre os exemplos mais recentes está a suspensão gritante de Irina Viner. Como planeia a Rússia responder a estas provocações? Vale a pena lutar pela participação em federações internacionais que perseguem objetivos antidesportivos?
Maria Zakharova: Vemos duas tendências. A primeira é as tentativas dos ocidentais de remover tudo o que os impede de dominar os assuntos internacionais, particularmente o desporto. Tudo o que eles consideram como concorrência insuportável que não podem vencer na pista de patinagem, no Tatami, na bolsa de valores, etc., deve ser destruído, na sua opinião. Destroem tudo. Quer moralmente, quer fisicamente. O caso dos gasodutos Nord Stream foi um caso da concorrência, não foi? Dois ramais foram destruídos porque, no mercado de energia europeu, os norte-americanos perderam a concorrência para o nosso país. Algo semelhante se verifica em matéria de desporto.
A segunda tendência é a "transformação" total dos desportos mundiais. Há vários aspetos e nuances. Os ocidentais estão a tentar fazer com que o desporto mundial sirva os seus interesses egoístas, eles querem destruir todos os princípios básicos do movimento olímpico, querem privatizar completamente o desporto mundial (o mais surpreendente, querem fazê-lo de graça), para o fazer servir os seus interesses exclusivos. Vemos estas tendências. Elas são óbvias.
A recente decisão da Federação Internacional de Ginástica de suspender a presidente da Federação de Ginástica Rítmica da Rússia, treinadora da seleção russa e lenda da ginástica mundial, Irina Viner, e proibi-la de participar ou receber acreditação para competições internacionais, está de acordo com as referidas tendências. Consideramos este gesto da Federação Internacional como outro exemplo de discriminação das personalidades oficiais desportivas nacionais e de atentado dos funcionários políticos ocidentais contra a independência do desporto, destinado a destruir o desporto mundial. Isto diz respeito não só à ginástica rítmica, mas a todo o desporto mundial. Diz respeito a tudo: ginástica, arbitragem, instituições internacionais que regulam o desporto e muitas outras coisas. Não foi por acaso que eu disse que ela é uma lenda. Ela não é apenas uma treinadora, mas uma pessoa que criou a atual ginástica rítmica mundial, começando com a forma como os elementos são apresentados, a dificuldade dos elementos técnicos e corporais, a apresentação desta modalidade desportiva e a sua implantação na mente de um grande número de pessoas, como forma de dar esperança às crianças, como forma de desenvolvimento pessoal. Quando se dá um golpe contra ela, se dá um golpe contra o desporto mundial. O mais cínico é que esta "punição" entra em vigor no dia seguinte ao levantamento das chamadas medidas "protecionistas" contra a equipa nacional russa impostas devido à crise ucraniana. Ao mesmo tempo, como sabem, nem todas as federações desportivas internacionais seguem cegamente as diretrizes russofóbicas do Ocidente. Elas estão a tentar analisar e avaliar a situação no desporto. Por outro lado, a parte sensata da comunidade desportiva internacional está a sofrer uma pressão sem precedentes por defender que os atletas russos regressem à comunidade desportiva internacional. Isto é muito importante. Esta história não é unicamente sobre a Rússia, mas sobre todos aqueles que se opõem ao domínio daqueles que não aceitam a concorrência e querem ser donos de todo o mundo em todos os aspetos imagináveis. Entendemos que só o desenvolvimento de uma cooperação desportiva em pé de igualdade, livre de politização e parcialidade, só uma competição leal e justa, e a garantia de que todos os países sem exceção tenham igual acesso à plena participação nos movimentos olímpicos e paraolímpicos podem satisfazer os verdadeiros princípios do Olimpismo e da independência do desporto. Pretendemos defender esta abordagem em conjunto com todos os representantes sensatos da comunidade desportiva internacional.
Pergunta: As relações da Rússia com África estão atualmente em bom andamento. Há exemplos de iniciativas locais, próximas da realidade, da iniciativa privada: uma grande rede de restaurantes russa abriu um negócio na Nigéria. Os negócios parecem estar a correr bem. Como tenciona o Estado apoiar uma iniciativa deste tipo? Que outros projetos económicos estão a ser desenvolvidos com parceiros africanos?
Maria Zakharova: Estamos a esforçar-nos por desenvolver sistematicamente as relações russo-africanas em vários domínios. Para além do diálogo político, é agora dada especial atenção à cooperação económica, humanitária, cultural e científica.
No que diz respeito à componente económica, é importante que, para além das áreas tradicionais de cooperação: a prospeção geológica, indústrias petrolífera, de gás e química, mineração, agricultura e pescas, tenha havido recentemente avanços no sentido da alta tecnologia. Estão a ser criadas fábricas de montagem em vários países africanos, e a cooperação está a desenvolver-se positivamente no espaço, nas tecnologias de informação e comunicação e na utilização da energia nuclear para fins pacíficos. As nossas empresas de serviços também estão com as atenções voltadas para este mercado promissor. Estamos convencidos de que a nossa cooperação com a região africana tem boas oportunidades e foi, em grande medida, estimulada pela primeira Cimeira Rússia-África realizada em Sochi em 2019 e pelo fórum económico realizado em simultâneo. A segunda Cimeira Rússia-África e o Fórum Económico e Humanitário previstos para julho próximo em São Petersburgo deverão contribuir muito para este processo. Esperamos que este evento reúna todos os interessados no desenvolvimento de um diálogo inclusivo, prontos a ajudar na promoção de iniciativas que visem o desenvolvimento socioeconómico dinâmico do nosso país e dos Estados da região africana e o bem-estar dos seus cidadãos.
Pergunta: Qual é a posição da Rússia sobre a prorrogação do "acordo de cereais"?
Maria Zakharova: A posição da Rússia é que o "acordo de cereais» é um pacote que contém dois conjuntos de compromissos que devem ser cumpridos. Falamos sempre sobre isto. Não pode ser dito de uma forma mais simples. Dizemos isso clara e concretamente. Os dois conjuntos de compromissos devem ser cumpridos. Registamos que os compromissos que compõem o segundo conjunto não são cumpridos. Precisamos de corrigir isto e fazer com que o acordo seja cumprido na totalidade.
Pergunta: O Presidente francês, Emmanuel Macron, concluiu recentemente um périplo por África, durante o qual manteve conversações na República Democrática do Congo, República do Congo, Angola e Gabão. A sua visita ao continente é vista, especialmente pelos meios de comunicação social franceses, como reação às preocupações sobre a crescente influência da Rússia e da China em África, embora, durante a sua visita, tenha declarado pessoalmente que a era da " Françáfrica" tinha terminado. Como avalia Moscovo o comentário de Emmanuel Macron sobre o fim da "Françáfrica"?
Maria Zakharova: Ouvimos tudo do que está a falar. No entanto, na realidade, vemos que, por detrás de todas estas declarações altissonantes, está um desejo banal de disfarçar a atitude consumista antiga para com a região e de reformatar o seu trabalho no terreno para que os mesmos resultados possam ser alcançados através de métodos mais perfeitos de "persuasão". O sonho de manter "atenção exclusiva" em África e de excluir outros "atores", sobretudo a Rússia e a China, ainda se mantém. Paris continua a selecionar países africanos escolhidos em que faz vista grossa aos golpes de Estado e às violações dos direitos humanos, desde que estes sigam cegamente a política francesa. Países com políticas independentes, contrárias às orientações dadas pelo Palácio do Eliseu, e que defendem os seus próprios interesses, querem diversificar os seus parceiros em matéria de cooperação económica, de segurança e cultura e que geralmente querem acabar com a duvidosa honra de fazer parte do clube africano da França e ser o "pátio traseiro" da França, são apresentados como principais violadores da democracia e da famigerada "ordem baseada em regras" e estão a ser submetidos a enorme pressão.
No entanto, os povos africanos, a atual juventude africana e as elites políticas da maioria dos países africanos, estão cada vez mais conscientes da atitude contraditória e arrogante de Paris para com o continente africano. É difícil para os neocolonialistas compreender que os povos de África, graças à sua história e luta pela independência, merecem há muito o direito de fazer amizades com as nações e civilizações com as quais desejam desenvolver e modernizar as suas sociedades sem dicas externas e defender os seus interesses nacionais de forma como entendem. Demonstraram claramente o seu desejo de ser soberanos ao Presidente Emmanuel Macron, realizando manifestações antifrancesas em massa durante a sua digressão africana. É ilustrativo.
Pergunta: Ontem, a senhora fez um breve comentário no seu perfil no Telegram sobre investigação sobre os gasodutos North Streams. Poderia, por favor, fazer um comentário mais extenso?
Maria Zakharova: Já comentei esta questão. Se tiver uma pergunta concreta, envie-a, eu responder-lhe-ei.
Pergunta: O Ministério da Defesa russo responsabilizou, no seu boletim informativo, o Azerbaijão pelo ataque aos polícias do Artsakh e pela escalada de 5 de março. Ao contrário do Ministério da Defesa, o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo absteve-se de apontar diretamente os responsáveis pela escalada. Parece que a recusa em criticar o Azerbaijão por violações regulares da Declaração Trilateral de 9 de novembro de 2020 é vista em Baku como reconhecimento da sua permissividade total. Isso provoca novas graves violações das declarações trilaterais, tais como o bloqueio do Artsakh ou a sabotagem azeri perpetrada a 5 de março. O que pensa sobre isto? O que pode dizer sobre as declarações do lado azerbaijanês, em particular do Ministério da Defesa do Azerbaijão que critica o Ministério da Defesa russo e a Força de Paz russa?
Maria Zakharova: O boletim informativo do Ministério da Defesa russo dá informações detalhadas sobre este incidente, tendo-se em conta a presença da Força de Paz russa no local. O comentário do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo contém uma avaliação política do que aconteceu. O ponto-chave é que apela às partes para que deem provas de comedimento e tomem medidas para desescalar a situação, e para que voltem a negociar no âmbito dos acordos tripartidos dos líderes da Rússia, Azerbaijão e Arménia. Posso dizer que a nossa posição é absolutamente clara e compreensível. Quanto à posição dos outros lados, é melhor dirigir a sua pergunta a eles.
Pergunta: Numa reunião com o Presidente do Azerbaijão, Ilham Aliev, o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, falando dos esforços de mediação de outros países, disse que "nós, como o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, afirmou repetidamente, saudamos todos os esforços para estabilizar a situação e criar condições que permitam a todos os países aqui localizados cooperar normalmente, com base no respeito e benefício mútuos, no interesse dos seus países e ainda mais". Mas depois, numa entrevista à Radio Sputnik lá em Baku, Serguei Lavrov e a senhora reagiram de forma bastante negativa aos esforços de mediação do Ocidente. Qual é então a posição da Rússia sobre os esforços de mediação de outros atores na região, em particular os EUA e da UE?
Maria Zakharova: O que é que não é claro?
Pergunta: Na reunião com os meus colegas, foi de alguma forma diferente.
Maria Zakharova: Diferente em que sentido? Exortamos sempre a ter-se como base os acordos trilaterais dos líderes da Rússia, Azerbaijão e Arménia (de 9 de novembro de 2020, 11 e 26 de novembro de 2021 e 31 de outubro de 2022) que estabelecem um roteiro para a normalização das relações entre Baku e Erevan. Esta mediação traz valor acrescentado e possibilita uma cooperação mutuamente benéfica em pé de respeito mútuo entre todos os países da região. Acreditamos que o objetivo dos EUA e da UE não é alcançar a paz e a segurança no Cáucaso Meridional, mas sim "interferir-se" no processo de paz e apropriar-se das nossas realizações, marcar presença (na melhor das hipóteses) e não desempenhar um papel construtivo. Não excluímos que possam desempenhar um papel destrutivo.
Porque acha que ainda não formulámos nem dissemos isso? Formulámos isso claramente e dissemos isso com toda a certeza. Sentimos a necessidade de explicar que não vemos nos seus esforços um valor acrescentado, pelo contrário, encaramos os seus esforços como ameaça acrescentada ao processo de paz. O que acha que é vago e não claro? Não concordo consigo.
Pergunta: O Ministério dos Negócios Estrangeiros russo disse estar pronto a prorrogar o "acordo de cereais" nas condições favoráveis à Rússia. Qual é a vantagem da Rússia com o "acordo"? Mantém-se a situação em que a maioria dos cereais exportados não vai para os países mais pobres, mas sim para a União Europeia, como afirmou o Presidente da Rússia, Vladimir Putin?
Maria Zakharova: A situação continua a ser a mesma. Já comentei hoje a nossa posição em relação ao "acordo de cereais". Gostaria de chamar mais uma vez a sua atenção para o comentário pormenorizado do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov.
Pergunta: Há alguns dias houve um incidente em Nagorno-Karabakh, onde soldados arménios foram baleados. Como está a decorrer a investigação do incidente, estão as partes a cooperar? Como se sabe, a Arménia e o Azerbaijão têm interpretações muito diferentes do que aconteceu.
Maria Zakharova: Todas as avaliações relativas ao incidente de 5 de março na zona de conflito de Nagorno-Karabakh, estão contidas no respetivo comentário do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia datado de 6 de março. Gostaria de salientar uma vez mais a necessidade de diminuir a tensão e fazer com que partes voltem, o mais rapidamente possível, à mesa de negociações.